Verdades e Mentiras sobre Custos na Saúde

Enio Jorge Salu – Publicado em 17 de Junho de 2019

 

 

As pirâmides populacionais que a figura ilustra não deixam dúvidas: os custos na saúde só tendem a aumentar enquanto a população estiver envelhecendo.

É fato: pessoas com mais idade acessam mais os serviços de saúde, e quando acessam utilizam mais recursos que os jovens. Conforme comento nas aulas, a maior prevalência de mulheres na terceira idade agrava o cenário, porque homens se acham “o máximo” e não vão ao médico ... e por isso morrem antes !

A questão é: qual a proporção real deste aumento, e o quanto ele está realmente afetando os sistemas de financiamento ?

Estou muito a vontade para afirmar, porque atuo profissionalmente em consultorias e não me atenho somente ao que é publicado na mídia e em estudos, que o aumento dos custos é menor do que reza a lenda, e estão sendo absorvidos pelos serviços de saúde e pelos profissionais de saúde (médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, psicólogos, nutrólogos ...).

Os próximos 2 gráficos já são conhecidos:

 

Na área pública, dados do SUS e da SRF, o fato ... a realidade ... é que a arrecadação de tributos aumenta mais do que os repasses para a área da saúde. Olhando os gráficos, não há como discordar que comparado com a arrecadação, os custos estão proporcionalmente diminuindo ... aumentando em números absolutos, mas diminuindo proporcionalmente !!!

Na área privada, dados da ANS, se compararmos a evolução da receita com as despesas assistenciais, o resultado é praticamente empate, nos últimos 12 anos !!

É claro que temos que levar em consideração uma dúzia de vieses, mas todos os indicadores demonstram que a elevação de custos assistenciais não afeta as fontes pagadoras. Mas elas estão reclamando que seus custos se elevam ... se não são custos assistenciais, do que se trata ?

Os próprios números da ANS trazem indicadores que nos permitem deduzir que a elevação dos custos assistenciais fica prioritariamente na origem. Este gráfico mostra que os custos das operadoras têm componentes importantes que não são assistenciais: administrativos, comercialização e outros. Estes custos não têm quase nada a ver com quem realiza os procedimentos – são decorrentes da estrutura interna da fonte pagadora.

Veja que interessante quando criamos um gráfico comparando a evolução do número de beneficiários com as despesas de comercialização:

·         Mesmo com queda de beneficiários novos, os últimos anos apresentam grande evolução anual de despesas de comercialização;

·         Não existe outro segmento de mercado onde as vendas caem e as despesas de comercialização crescem ... o que o hospital, o médico, o fornecedor de insumos ... o que eles têm a ver com isso ?

Ao analisar o gráfico de evolução de beneficiários em comparação com despesas administrativas ocorre o mesmo:

·         Alguém dirá que parte desta despesa se refere ao sistema de apresentação e auditoria das contas ... você pode acreditar que seja este o fator motivador ... tenho razões técnicas e milhares de dados para afirmar que não;

·         Muitas operadoras criaram verdadeiros mitos de gestão ... por exemplo: algumas pensam que fazer tudo dentro de casa é sempre mais barato do que comprar pronto. Enquanto serviços de saúde desenvolveram ao longo dos anos parcerias para terceirizar tudo que pode para aumentar a qualidade e reduzir os custos, tem operadoras que acham pecado credenciar qualquer tipo de coisa.

Nas consultorias estou acostumado a me deparar com empresas que investem na especialização para calcular custos ... e em raras exceções empresas que investem para realmente reduzir custos, que são coisas totalmente diferentes. Vejo departamentos de custos com dezenas de profissionais administrativos que calculam o custo de uma diária de UTI e nunca entraram em uma ... não sabem a diferença entre UTI, Semi, UCO Chegam em um numero “contabilmente perfeito”, e ninguém sabe, nem tem responsabilidade de avaliar como reduzir o custo, ou se vale a pena comprar este serviço de outra empresa !!!

2 verdades incontestáveis:

·         O custo da saúde, como o custo de qualquer atividade que empenha tanta mão de obra e tecnologia, inevitavelmente vai sempre crescer;

·         Existe desperdício no sistema de saúde público e privado.

2 mentiras que os números demonstram serem incontestáveis:

·         O aumento de custo está quebrando as fontes pagadoras;

·         Serviços de saúde e médicos não são os vilões do aumento de custos.

2 reflexos do cenário:

·         Enquanto serviços de saúde e médicos estão reduzindo sua remuneração pelos serviços, fontes pagadoras gastam relativamente cada vez mais com despesas indiretas (administração, regulação, comercial ...);

·         Na ponta do sistema, pacientes são os mais prejudicados – restrição cada vez maior de acesso ao sistema público e privado de saúde.