Análise da Queda nas Internações por CID Permite Projetar Queda de Sinistralidade para Fontes Pagadoras
Enio Jorge Salu – Publicado em 13/07/2020
(*) Todos os gráficos são partes integrantes do Estudo Geografia Econômica da Saúde no Brasil – Edição 2020
O gráfico demonstra a evolução do volume de internações anual, sinalizando que nos anos anteriores havia crescimento constante, mas entre maio de 2019 e maio de 2020 foi registrada queda superior a 34 % !
Mostra que já estamos tendo acesso aos dados dos sistemas de financiamento público e privado que se referem ao período em que o COVID-19 começou a afetar a economia da saúde:
· Um deles é o volume de internações por CID (Diagnóstico);
· Até agora os dados que tínhamos eram tabulações dos dados financeiros que se referiam aos atendimentos de meses anteriores a Março de 2020;
· Os dados de Maio, embora ainda tenham algum viés temporal, já começam a refletir o que ocorreu com o SUS e a Saúde Suplementar a partir do início da pandemia.
Estávamos vendo projeções de especialistas sobre o que aconteceria sem dados reais de impacto:
· Algumas previsões com boa base científica, e outras “na base do achômetro”;
· Tantos as “previsões científicas” como as demais poderão acertar ou errar na previsão, afinal a ciência se baseia no histórico, e a pandemia é algo inusitado, e o “achômetro”, tal qual o horóscopo, pode acertar ou errar;
· Com dados que agora começaremos a ver, poderemos aferir.
Os dados ainda são os iniciais – ainda tem vieses:
· Quem já cursou alguma disciplina de epidemiologia sabe que o registro do diagnóstico não é 100 % seguro;
· Quem já trabalhou em projetos de gestão de processos, de TI e quem conhece a estrutura dos hospitais que lidam com esta informação sabe que os departamentos “não primam” pela excelência do registro do CID;
· E se referem ao período do início da pandemia, que pode se modificar nos meses seguintes.
Mas mesmo com os vieses, pelos números tabulados, o perfil dificilmente será muito diferente !
Começando pelo maior dos vieses:
· O Brasil não é um pequeno país, como Portugal ... é quase um continente, como a Europa;
· As coisas não acontecem da mesma forma em todo o território nacional;
· O gráfico demonstra a variação percentual de internações entre maio de 2019 e maio de 2020 em cada UF;
· Quanto mais escura, maior a redução, ou seja, no Pará a redução geral de internações foi extremamente maior que no Paraná. O vírus não chegou ao mesmo tempo em todas as localidades – o caso do Pará, como veiculado na mídia, foi notório: ao praticamente lotar todas as UTIs quase instantaneamente, todos os outros tipos de atendimentos para outras doenças foram prejudicados.
Analisando os 10 primeiros grupos CID, observamos que as internações por doenças infecciosas e parasitárias sofreram redução muito pequena comparada às demais:
· Vamos lembrar que é um dos grupos mais associados ao COVID-19;
· Mas é interessante notar que não registrou aumento, até estes dados de maio, porque tínhamos uma enorme limitação de número de leitos especializados para tratamento da doença, e as ações de ajustes da estrutura física disponível só começaram a acontecer nos meses seguintes para dar vazão ao número de necessitados.
Os outros grupos registraram queda acima de 30 %, com algumas especialidades (Ouvido e Olhos) registrando queda de mais de 70 !!
Notar que internações para tratamento de tumores reduziram 30,93 % - algo extremamente preocupante em se tratando de uma doença “que não pode esperar pelo tratamento”.
Analisando os outros grupos:
· O capítulo 16 também tem relacionamento íntimo com o COVID-19 registrando pouca redução – similar ao capítulo 1;
· Parto e puerpério também com índice significativamente menor que os demais, porque “a criança não espera para nascer”, e envenenamentos “não esperam para matar”;
· Mas nos demais a queda foi bem significativa !
Com os dados da média de internações por CID, do custo do sistema por CID, o novo perfil de internações por CID que o COVID-19 está desenhando, e com a média histórica de volume e custos dos atendimentos externos (ambulatorial, pronto socorro, home care ...) por grupos de procedimentos que se associam ao CID:
· Já é possível afirmar que a sinistralidade do SUS e das operadoras de planos de saúde será muito menor do que estava na planilha de custos. Podemos já estimar a diferença de queda da sinistralidade no SUS e até para cada operadora de planos de saúde;
· Lembrando que o % de queda de sinistralidade não é o % de aumento da rentabilidade ... nos cursos de gestão de custos, rentabilidade e precificação de junho discutimos exaustivamente a diferença. Podemos comentar sobre isso oportunamente;
· Para calcular a rentabilidade necessitamos incrementar a base de dados com a quantidade de beneficiários e receitas de contraprestações, que também começamos a tomar contato agora ... comentar sobre a rentabilidade será feito oportunamente.
E com os mesmos dados já estamos conseguindo projetar a queda de rentabilidade dos vários tipos de serviços de saúde que também faremos oportunamente:
· Como sempre dizemos nas consultorias e cursos, o que é bom para a fonte pagadora é ruim para o serviço de saúde, e vice-versa;
· Observamos com preocupação a diferença entre o cenário favorável da queda de sinistralidade para as operadoras, e a queda de rentabilidade para os serviços de saúde em 2020.
Basta imaginar, se mantiver a queda de internação em doenças dos olhos na faixa de 70 %, a quantidade de hospitais e clínicas especializadas em oftalmologia, e de fornecedores de insumos envolvidos, que não conseguirão suportar a queda de faturamento:
· O mesmo vale para serviços especializados em otorrino, também com queda de internação acima de 70 %;
· Ortopedia com queda de quase 60 %.
Vamos torcer para que a tendência não se perpetue nos dados que vamos tabular por muitos meses:
· Não é uma questão de torcer para serviços de saúde ou operadoras ... não se trata de um jogo;
· Todos os atores envolvidos nos sistemas de financiamento público e privados são interdependentes ... de um lado ou de outro da mesa de negociação;
· O desequilíbrio no cenário preocupa ... no fim a assistência é prejudicada ... a população e os beneficiários dos planos de saúde são os mais prejudicados.
Senhores governantes: “está passando da hora de agir” ... não estamos vendo movimento !!!