Faixa Etária Regional - Importante para Viabilizar Pacotes e Remuneração Baseada em Valor

Muitos Projetos Fracassam Quando Gestores Negligenciam a Demografia Regional

Enio Jorge Salu – Publicado em 1 de Outubro de 2020

Quem não é do ramo pensa saúde como se o produto cura fosse uma ciência exata, e o cuidado pode ser o mesmo para todos os clientes ... como se fosse um fast food vendendo o mesmo lanche para todos os clientes, em lojas de shopping, de rua.

Por exemplo: quanto mais jovem é a pessoa, menos consegue entender a dificuldade de um doente em fazer um exercício de reabilitação, que ele repete centenas de vezes em um jogo de futebol !

Os clientes da saúde de idade diferentes são tão diferentes que os preços dos planos de saúde variam em função dela ... e muitos gestores esquecem disso quando desenvolvem produtos e parcerias entre a fonte pagadora e o serviço de saúde !

(*) Todos os gráficos são partes integrantes do Estudo Geografia Econômica da Saúde no Brasil – Edição 2020

Este é o perfil geral da distribuição dos beneficiários de planos de saúde no Brasil por faixa etária:

· É diferente do perfil da população geral, especialmente nas faixas etárias menores;

· O Brasil já não é mais o país jovem de antes e a população geral não tem esta proporção de crianças;

· Na saúde suplementar os pais renunciam a muita coisa na vida para garantir a saúde dos seus filhos, então nós temos uma concentração nestas faixas etárias um pouco maior que na população geral.

A divisão nestes grupos é a definida na regulação da ANS, e muitos já defendem que a faixa etária mais elevada seja desmembrada em função do envelhecimento da população ... mas isso é outra discussão.

Tratar pacientes de faixas etárias diferentes envolve procedimentos (e custos) muito diferentes, principal razão do preço dos planos de saúde serem diferentes por faixa etária ... é a principal razão, mas não a única ... existem fatores comerciais quase tão importantes ... mas isso também é outra discussão !

Quando se define o pagamento de procedimentos por pacote, por performance, ou por classificação de serviços e procedimentos, e não se condissera a faixa etária como parâmetro de diferenciação, é comum que a proposta de mudança de modelo de remuneração acabe fracassando ... é simples explicar !

Se o valor da conta aberta varia significativamente em função da idade do paciente, a proposta de um pacote que não considere isso inviabiliza a negociação:

· Mesmo em procedimentos muito padronizados;

· Por exemplo, um joelho. A técnica cirúrgica pode ser exatamente a mesma, independente da idade do paciente, mas os procedimentos relacionados podem variar muito no caso de um adolescente, e de uma pessoa de mais de 60 anos ... por melhor que seja a técnica e a execução;

· Presenciei diversos episódios reais de negociações que não caminharam em função disso – a proposta do pacote era viável para determinada faixa etária, mas não para outra, e como a carteira de beneficiários da operadora estava muito concentrada na faixa etária da inviabilização, o negócio não prosperou, por mais boa vontade que o serviço de saúde pudesse ter.

O mesmo ocorre nas propostas de remuneração baseada em valor:

· Quando se engloba o procedimento, a reabilitação e os efeitos adversos, os parâmetros podem ser muito aderentes para determinadas faixas etárias, mas não para outras;

· Isso não necessariamente se refere aos extremos da classificação ... o corpo humano tem fases de modificação em faixas etárias intermediárias. Quantas vezes escutei médicos dizerem que o corpo da mulher muda substancialmente aos 35 anos, o homem aos 40 – não tenho formação assistencial para saber se dizem a verdade, mas perdi a conta das vezes que ouvi isso.

O que chamo a atenção é que este primeiro gráfico é uma média nacional, mas a carteira de beneficiários de planos de saúde está longe de seguir este padrão !

Veja o que acontece quando estratificamos o dado por algumas UFs:

· O Amazonas tem como perfil maior concentração nas faixas etárias menores, e menor concentração nas maiores, exatamente ao contrário do Rio de Janeiro, e o Distrito Federal fica “em cima do muro” em toda a série;

· Só analisando isso fica fácil entender porque pacotes de partos são mais aderentes em Manaus do que no Rio – a incidência de partos complicados lá é menor, por conta das mulheres serem mais jovens. Se partir para remuneração baseado em desfecho, nesta situação é muito mais fácil pensar em preço por todo o ciclo do parto em Manaus do que no Rio: o desfecho tem mais chance de ser favorável em Manaus.

Por isso a proposta de pacotes nacionais, de modelos de remuneração baseados em valor com os mesmos parâmetros em todo o território nacional não tem a mesma aderência ... não tem como ter !!!

Não sei se já tiveram a oportunidade de ver como o Brasil é diferente em relação à faixa etária dos beneficiários regionalmente.

Este gráfico ilustra a distribuição de cada faixa etária padronizada pela ANS em cada UF do Brasil:

· Note uma coisa muito interessante, que os números mostram ... não é discurso;

· Quanto menor a faixa etária, mais escuro está o mapa ao norte do Brasil;

· E nas faixas etárias maiores, o Sul do Brasil vai ficando mais escuro;

· Veja que no primeiro quadro você nem diferencia RJ do ES, mas nu último ele fica bem visível;

· Veja como a tonalidade do RS vai escurecendo quadro a quadro, conforme a faixa etária vai aumentando;

· Demonstra que não dá para entender negócios em saúde no Brasil da mesma forma de norte a sul, de leste a oeste ... são vários “mini países diferentes” quando pensamos em saúde.

Este é um dos exemplos em que nos concentramos nos projetos e cursos que tratam de pacotes e remuneração baseados em valor:

· Se estiver utilizando os conceitos para quebrar seu opositor e não como instrumento de melhoria do sistema de financiamento ... boa sorte ... o resultado dos projetos e das negociações não terá nada a ver com aspectos técnicos, e será tão previsível quanto adivinhar em qual casinha da roleta a bolinha vai cair;

· Se estiver pensando na melhoria do sistema de financiamento, e em uma relação de parceria entre fonte pagadora e serviço de saúde, comece não importando parâmetros de outros países para aplicar aqui no Brasil;

· E não negligencie diferenças regionais ... então não será uma questão de sorte – o mercado tenderá a aderir ao projeto !!