Paradoxo entre a Saúde da População e a Saúde Penitenciária no Brasil

Número de Estabelecimentos de Atenção para a Saúde Carcerária Cresce Mais que a Média Geral

Enio Jorge Salu – Publicado em 3 de Novembro de 2020

 

 

(*) Todos os gráficos são partes integrantes do Estudo Geografia Econômica da Saúde no Brasil – Edição 2020

 

Um tema bem oportuno em se tratando de ano eleitoral, e atípico quando consideramos que uma enormidade de serviços de saúde privados agoniza por falta de sustentabilidade financeira devido aos efeitos da pandemia na atenção primária na saúde suplementar !

 

É importante iniciar analisando os gráficos que demonstram a complexidade da política carcerária no Brasil (dados do CNMP – Conselho Nacional do Ministério Público).

 

O primeiro gráfico ilustra a distribuição geográfica dos estabelecimentos carcerários:

·         O segundo, a distribuição geográfica Per Capita dos presos;

·         Já nestes 2 observa-se que não existe relação direta nem entre o número de estabelecimentos e a população, e nem entre a população carcerária e a população. Uma mescla de condições sociais e políticas públicas define a forma como a gestão carcerária é conduzida no Brasil, com diferenças regionais significativas.

 

O terceiro e o quarto gráficos demonstram a capacidade carcerária e a ocupação carcerária:

·         É possível identificar que a ocupação, na média geral, é de 160 %;

·         Existe íntima relação entre os dados de cada UF (dá para ver pela tonalidade da cor) ... superlotação é um problema bem equalizado em todas as regiões do Brasil.

 

 

Neste cenário tenebroso existem seres humanos que necessitam de atendimento médico, odontológico, psicológico ... como qualquer outro ser humano:

·         O que sempre se discute quando o tema é colocado em pauta nunca é a necessidade de prover atenção á saúde desta população específica;

·         O que se coloca sempre é a origem do recurso e a priorização da destinação dos recursos do SUS para tal;

·         O gráfico ilustra que enquanto os estabelecimentos especializados tiveram crescimento de 5 % entre 2018 e 2019, os serviços especializados para atenção à saúde carcerária cresceram 8,3 %.

 

E temos a particularidade de que no primeiro indicador temos investimentos públicos e privados, enquanto no segundo apenas público !

 

Nos acostumamos a presenciar discussões entre defensores de maior investimento neste tipo de serviço com os que defendem que não se deve priorizar este tipo uma vez que os recursos são escassos e priorizar um obrigatoriamente representa reduzir os demais:

·         É outro daqueles assuntos em que é muito complicado se posicionar;

·         Por um lado a população que efetivamente contribui para o SUS, através das contribuições tributárias, é penalizada;

·         Por outro lado, a maior parte da população carcerária é completamente indefesa economicamente, e a que não tem escolha (opção) para utilizar outros serviços.

 

 

Em meio a este cenário, cada UF, de acordo com a sua necessidade, acaba tratando o tema de forma diferente:

·         O gráfico ilustra a relação entre o volume de serviços públicos especializados em atenção carcerária, e o volume de presídios;

·         A variação é significativa entre a UF de menor relação (4,2% – PA) e a de maior relação (76% – BA);

·         Analisando detalhadamente os números podemos observar que as maiores relações não se dão pela diferença relativa maior do volume de serviços, mas sim pelo menor volume de presídios.

 

 

O fato é que nos 4 tipos de estabelecimentos, segundo a classificação do CNES, a tendência de aumento no número de serviços especializados neste tipo de atenção é de crescimento, como demonstram os gráficos.

 

 

Diferente do que ocorre com a evolução de vários outros tipos de serviços especializados:

·         O gráfico ilustra alguns deles – todos com evolução menor que o de atenção à população carcerária;

·         E todos eles de vital importância para a população que deles necessita.

 

Reforçando a discussão: não se trata de defender a priorização de outros em relação ao atendimento da população carcerária – trata-se de não priorizar nenhum deles para que a diferença na evolução, necessária para equiparar deficiências, não seja tão significativa.

 

Quando as discussões políticas sobre o “sotaque da vacina” contra a COVID-19 se intensificarem após as eleições (até lá o que vemos hoje “é fichinha perto da baixaria” que veremos), e forem definidas as prioridades de vacinação, uma vez que não dá para vacinar todo mundo ao mesmo tempo, outra “discussão ideológica” será travada: qual a prioridade de vacinação da população carcerária ?