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Certificação da Qualidade Adere Mais em Cooperativas do que nas Outras Operadoras
0201 – 13/07/2021
Referências: Geografia Econômica da Saúde no Brasil e Jornada da Gestão em Saúde no Brasil
Números Demonstram Inviabilidade do Mesmo Padrão para Certificar Qualidade em Todas as Operadoras
(*) todos os gráficos e tabelas são partes integrantes do Estudo Geografia Econômica da Saúde no Brasil
É meio repetitivo afirmar que a ANS define uma série de normativas que são absolutamente inadequadas quando aplicadas para todos os tipos de operadoras de planos de saúde:
· Acreditação é uma delas;
· Para se certificar basta olhar o gráfico da distribuição percentual das operadoras certificadas no final de 2020, separando as Unimeds das demais;
· É fácil concluir que uma desproporção tão grande só pode ocorrer se a motivação dos tipos de operadoras for muito diferente para aderir ao que se propõe igualmente para todas elas !
Boa parte das vezes a ANS passa a impressão de que não entende que operadoras de planos de saúde não são concessionárias de telecomunicações, de energia elétrica, empresas de transportes e outras instituições que atuam em nome do governo sob forma de concessão:
· Sendo saúde livre à iniciativa privada (explícito na constituição) agrega operadoras de planos de saúde vinculadas aos mais diversos tipos de instituições mantenedoras, que não têm nada a ver umas com as outras;
· A única coisa que operadoras com ou sem fins lucrativos, gigantes ou anãs, públicas ou privadas, sociedades simples ou empresariais ou cooperativas, para funcionários de uma única empresa ou para funcionários de várias empresas ... ou seja, da água para o vinho ... a única coisa que elas têm em comum é operar planos de saúde ... e planos que, diga-se de passagem, que não têm nada a ver uns com os outros !
Então ... quando se fala em qualidade em um universo desses seria mandatório estabelecer parâmetros diferentes:
· Para a maior autogestão do Brasil, vinculada a uma das maiores empresas do Brasil, ou para uma autogestão de 1.000 funcionários, vinculada a uma empresa de 1.000 funcionários ... não dá para entender qualidade da mesma forma;
· Para uma empresa com fins lucrativos, cujos sócios granjeiam os dividendos, ou para uma cooperativa de médicos que se distribuem por toda a cadeia de valores da fonte pagadora e dos prestadores de serviços, ou para uma instituição filantrópica ... não dá para entender qualidade da mesma forma;
· Se fizer isso ... a “pizza” de distribuição das operadoras que aderem ficará sempre desta mesma forma !
Quando olhamos desavisadamente o gráfico de evolução do número de operadoras acreditadas até ficamos empolgados em tratar do tema:
· É uma evolução significativa que dá a impressão de que qualidade está na agenda de todas elas;
· É uma evolução muito maior, por exemplo, do que verificamos em relação aos serviços de saúde acreditados;
· Mas ao comparar o número total de acreditadas com o número total de operadoras, temos que admitir que é muito pouco !
Tudo se relaciona com a motivação que cada tipo de operadora tem em adotar um modelo de acreditação:
· Quando falamos de Unimeds, existe uma “governança” padronizada no sistema. As singulares contam com o apoio das federações, o sistema apoia as federações ... então mesmo as pequenas têm suporte para desenvolver o programa. E as Unimeds se vinculam às mantenedoras Unimeds ... apenas a elas;
· Quando falamos de empresas de autogestão, temos operadoras vinculadas a mantenedoras do segmento financeiro, outras vinculadas à indústria, outras vinculadas a prefeituras ... cada uma dentro do seu segmento de mercado com culturas organizacionais diferentes. Muitas já têm que estar dentro de parâmetros de qualidade definidos pelo seu setor da economia ... um outro padrão definido pela área da saúde, que não é “a área fim” da mantenedora ... é um transtorno ... não ajuda em nada;
· E assim sucessivamente quando falamos dos outros tipos de operadoras, e subtipos ... medicina de grupo, odontologia de grupo ... as medicinas de grupo com planos hospitalares e ambulatoriais, ou somente ambulatoriais ...
É muito diferente do que aplicar um mesmo manual de boas práticas para tratar pacientes em um serviço de saúde:
· Lá no serviço de saúde, independente da mantenedora, do tamanho, do objetivo social, os processos ficam “entre as 4 paredes” do serviço de saúde com foco na segurança do paciente ... para acreditação em serviços de saúde o resto não importa;
· Lá na operadora a acreditação não vai colocar nunca a segurança do beneficiário, a qualidade regrada por aspectos técnicos assistenciais, a experiência do paciente como prioridade, porque diferente do serviço de saúde cujo produto é saúde, na operadora, queiram ou não admitir alguns, o produto é financeiro.
A operadora pode estar inserida em um contexto de negócios onde “saúde” é insignificante em relação ao foco da mantenedora ... inserir um padrão de qualidade proprietário da saúde em um contexto de negócios diferente jamais vai dar alguma motivação para as mantenedoras destas operadoras !
Ainda não sabemos como será 2021:
· O volume de novas acreditadas vinha crescendo até 2017, começou a cair, e em 2020 por uma situação particular no Sistema Unimed deu uma reagida ... poderia ter crescido mais ... mas veio a pandemia;
· Como 2021 tende a ser um ano de 12 meses de pandemia, ao contrário de 2020 que foi um ano de 9 meses de pandemia, a perspectiva não é boa ... é esperar para ver.
O fato é que se não fosse pelo Sistema Unimed, este gráfico não estaria puxado para cima de forma tão acentuada:
· Observando o gráfico fica bem claro que a participação dos demais tipos de operadoras é muito pequena no tema qualidade;
· No Sistema Unimed, uma organização que não tem dono, que tradicionalmente prima pela qualidade assistencial, uma vez que os cooperados além de envolvidos são comprometidos com os resultados por estarem permeados por toda a cadeia de valores, uma vez colocado o tema em pauta, os projetos de inovação acabam vingando.
Outro indício que a regulação não é adequada é demonstrada pelos números relativos ao nível da certificação:
· As certificadas, que são poucas, estão concentradas no primeiro nível;
· Mesmo com o viés de que existe um tempo de maturação para migrar, a diferença é muito significativa;
· Nos serviços de saúde o tempo de migração de nível, nas certificações que têm nível, não é grande ... é “emocionante” convencer o serviço de saúde a “dar um boi para entrar na briga”, mas depois que entra ele “dá uma boiada para não sair”, toma gosto pelo resultado e vai evoluindo para conseguir tirar o máximo do projeto.
Pelo gráfico é possível perceber que já existe massa de certificadas há um bom tempo para que tivéssemos mais nos Níveis II e III do que temos.
O futuro nos reserva dois caminhos por parte da ANS:
· Rever a regulação de modo a definir padrões de qualidade mais aderentes aos vários cenários que envolvem as operadoras;
· Manter “a marra” e impor penalidades para quem não aderir.
O segundo caminho, que tem muita chance de ser o escolhido, vai produzir o pior resultado que se espera de um programa de qualidade:
· Quando o processo de certificação é mais importante do que a qualidade;
· Quando se define o que se vai fazer para “passar pela auditoria” e não para melhorar os processos;
· Quando ao invés de investir em processos que dão resultados, se gasta para meramente cumprir uma normativa e não pagar multas.
O primeiro caminho seria o melhor:
· Definir parâmetros simples que sejam aderentes a realidade de cada tipo ... de cada tamanho ... considerando os objetivos sociais e o cenário geoeconômico que envolve as operadoras;
· Como agência governamental que não regula concessionárias, dar foco na qualidade do produto entregue ao cliente, e ficar longe ... bem longe ... de processos internos das instituições que operam planos de saúde, e dos processos assistenciais que que não podem ser totalmente governados pelas operadoras.
Se quiser que as operadoras passem a aderir mais aos programas de qualidade a ANS cabe entender que as redes assistenciais das operadoras de planos de saúde no Brasil, com raras exceções, são completamente fragmentadas:
· O diagnóstico ocorre em um serviço, a assistência ocorre em diversos outros serviços, e a reabilitação em outros tantos serviços;
· Uma prova disso está no alto volume de multas e de ressarcimento ao SUS;
· Outra prova é o total fracasso da narrativa de remuneração baseada em valor com operadoras que não entregam o beneficiário para ser cuidado por um serviço parceiro: fazem o pré cirúrgico onde é mais barato, pacote cirúrgico onde é mais barato, e reabilitação onde é mais barato ... discursam “valor” como qualidade, mas praticam “valor” como redução de preços.
Acreditar que a operadora pode gerenciar a qualidade do cuidado dos beneficiários que na verdade são “ciganos que vivem de tenda em tenda para serem assistidos” é um grande erro !
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Sobre o autor Enio Jorge Salu
Histórico Acadêmico
· Formado em Tecnologia da Informação pela UNESP – Universidade do Estado de São Paulo
· Pós-graduação em Administração de Serviços de Saúde pela USP – Universidade de São Paulo
· Especializações em Administração Hospitalar, Epidemiologia Hospitalar e Economia e Custos em Saúde pela FGV – Fundação Getúlio Vargas
· Professor em Turmas de Pós-graduação na Faculdade Albert Einstein, Fundação Getúlio Vargas, FIA/USP, FUNDACE-FUNPEC/USP, Centro Universitário São Camilo, SENAC, CEEN/PUC-GO e Impacta
· Coordenador Adjunto do Curso de Pós-graduação em Administração Hospitalar da Fundação Unimed
Histórico Profissional
· CEO da Escepti Consultoria e Treinamento
· Pesquisador Associado e Membro do Comitê Assessor do GVSaúde – Centro de Estudos em Planejamento e Gestão de Saúde da EAESP da Fundação Getúlio Vargas
· Membro Efetivo da Federação Brasileira de Administradores Hospitalares
· CIO do Hospital Sírio Libanês, Diretor Comercial e de Saúde Suplementar do InCor/Fundação Zerbini, e Superintendente da Furukawa
· Diretor no Conselho de Administração da ASSESPRO-SP – Associação das Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação
· Membro do Comitê Assessor do CATI (Congresso Anual de Tecnologia da Informação) do Centro de Tecnologia de Informação Aplicada da Fundação Getúlio Vargas
· Associado NCMA – National Contract Management Association
· Associado SBIS – Sociedade Brasileira de Informática em Saúde
· Autor de 12 livros pela Editora Manole, Editora Atheneu / FGV e Edições Própria
· Gerente de mais de 200 projetos em operadoras de planos de saúde, hospitais, clínicas, centros de diagnósticos, secretarias de saúde e empresas fornecedoras de produtos e serviços para a área da saúde e outros segmentos de mercado