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Não tem como a saúde deixar de entrar na mira do ambientalismo
0253 – 22/01/2022
Referências: Geografia Econômica da Saúde no Brasil e Jornada da Gestão em Saúde no Brasil
O “modelo descartável” precisa ser rediscutido de “ponta a ponta” em um dos segmentos que mais poluem o mundo
(*) todos os gráficos e ilustrações são partes integrantes do Estudo Geografia Econômica da Saúde no Brasil e do material didático dos cursos da Jornada da Gestão em Saúde e da Escepti
Quem aproveitou as festas antes da “onda Ômicron” para matar as saudades dos quiosques de praia ... dos barzinhos em estâncias turísticas ... dos hotéis ... percebeu que está “aumentando o cerco” em torno dos canudinhos de plástico.
Muitos acredito que lembram de uma “celebridade” que abraçou a causa das sacolinhas plásticas em uma campanha patrocinada por uma rede de supermercados ... e na campanha citou os canudinhos associando os dois no dano causado na natureza:
· São duas coisas completamente diferentes: um só causa danos e não é reutilizável ... o outro causa danos mas “tem lá” alguma reutilização e até auxilia famílias menos favorecidas economicamente ... muitas delas, sem os saquinhos, descarta lixo diretamente em córregos e áreas verdes, especialmente em regiões metropolitanas, porque se não tem dinheiro nem para comprar comida, quanto mais para comprar sacos de lixo !
· Inclusive, o “cartel comercial” dos supermercados se apoderou do discurso para poder vender como produto algo que é embalagem ... embalagem que é um direito do consumidor em qualquer tipo de estabelecimento ... menos em supermercados onde o “lobby” prevaleceu ! ... se fosse mesmo “causa” e não “intenção lucrativa” dos supermercados eles teriam investido em patrocinar a proibição de venda de canudinhos e não a lei que permite a venda de sacolinhas “por um preço criminoso”, diga-se de passagem !!
A “celebridade” dizia que não pode existir algo mais absurdo do que o consumo de canudinhos ... que são utilizados por alguns segundos e descartados no meio ambiente ... onde vão demorar anos para se decompor:
· Acertou “em cheio” em relação ao uso absurdo ... é claro que é ... e em relação ao tempo de decomposição ... sem a menor chance de dúvida;
· Mas errou em relação ao fato de que não pode existir algo mais absurdo quando se fala do assunto ... não teria dito isso se conhecesse um pouco o segmento da saúde.
Com todo o respeito ... sempre ... sempre ... sempre respeitando ao máximo a opinião de outras pessoas:
· As sacolinhas plásticas têm um papel social muito maior do que a narrativa de quem está cobrando por elas no caixa dos supermercados ... os que patrocinam a lei que obriga pessoas de menor poder aquisitivo a pagar por algo para aumentar seu lucro;
· Uma questão bem simples: ou se proíbe a distribuição porque o produto é danoso e fútil ... não permitindo de forma que seja utilizado ... ou não se pode permitir a venda ... não é verdade ?
· Ou será que quando o produto é vendido deixa de fazer mal ao meio ambiente ?
Os produtos da figura acima, utilizados na área de alimentação, embora indiscutivelmente poluidores, e que já deveriam estar na mira da construção de alternativas para minimizar seu uso ... ou para construir uma rede de captação mais eficiente para reciclagem ... são menos impactantes ao meio ambiente do que é descartado em larga escala na natureza pela área da saúde !
O cálculo demonstra que somente no Brasil seria possível dar uma volta na Linha do Equador enfileirando as máscaras descartáveis após sua utilização em serviços de saúde ... em apenas ~11 dias !
· Quando dizemos Linha do Equador, significa dar “uma volta no mundo inteiro” ... na “maior circunferência” que ele tem !
· Você pode ajustar este cálculo minimizando as quantidades utilizadas da forma como quiser, uma vez que são números estimados e não coletados segundo melhores práticas científicas;
· Mesmo que o cálculo estiver “10 vezes errado” ... e “olha que haja esforço e criatividade” para errar algo tanto assim ! ... ainda seriam necessários apenas 111 dias para dar “uma volta no novelo” !!
E estamos falando somente de máscaras descartadas em serviços de saúde no Brasil:
· Não estamos citando as utilizadas em todos os serviços de saúde no mundo;
· E nem estamos citando as máscaras que todos passaram a utilizar desde que chegou a pandemia fora dos serviços de saúde ... as que passamos a utilizar na nossa rotina responsável de prevenção da nossa saúde e, principalmente, da saúde das pessoas com quem convivemos socialmente !!!
E se na área da saúde nosso problema com o meio ambiente fosse somente as máscaras ... que bom seria !
· Seringas, agulhas, toucas, cateteres ...
· ... depósitos gigantescos de soros em serviços de saúde ... o soro vai pro organismo ... a embalagem de plástico pro lixo !
Se fizéssemos o cálculo de quantos dias todo este lixo demoraria para cobrir a face da Terra, criando “touca” fabricada com “lixo descartável”, certamente ficaríamos muito mais preocupados com o rumo que o descartável tomou na área da saúde ... e talvez deixássemos para depois o apoio aos “cartéis das sacolinhas” para nos empenhar em dar solução para coisas muito mais danosas para a sociedade ... para o meio ambiente !
Se já se escandalizou ao saber quanto tempo demora para um canudo plástico se degradar na natureza ... compare com o tempo de decomposição de uma seringa, um frasco de soro, um cateter ... uma agulha !!!
Se acha absurdo descartar um canudinho que é utilizado por 1 ... 2 minutos em um “boteco” ... seringa e agulha na área da saúde “meu amigo”: 1 ou 2 segundos !
Quem é mais velho, como eu, viu unidades de internação onde medicamentos eram dispensados a partir de vidros grandes que ficavam no “armário da unidade” ... as farmácias de serviços de saúde que conhecemos hoje são “eventos” recentíssimos da história da medicina:
· Tinham vidros de 2 ... 3 litros ... cheios de comprimidos ... a enfermagem “pegava” os comprimidos e dava ao paciente de acordo com a prescrição ... e você pode não acreditar, mas em muitos países do mundo isso ainda acontece ... e, é claro, evidentemente traz muitos riscos à assistência, não só pela contaminação por manipulação do medicamento, mas pelo fato do recipiente ser de vidro !
· Hoje a regulação mundial e as “boas práticas” obrigam que sejam embalados individualmente;
· Cartelas de plástico ... vasilhames de plástico ... seringas preenchidas !!!
· Dentro da “farmácia hospitalar” reembalados em “tirinhas” de plástico individualizadas para cada prescrição ... é “plástico a dar com pau” !!
· Quantos medicamentos você conhece que a embalagem é muito ... mas muito ... mas muito mais cara que o medicamento ... e o volume da embalagem muito ... mas muito ... mas “gigantemente maior” do que do medicamento ?
· Além da embalagem ser mais cara e maior ... o medicamento vai para o organismo ... a embalagem pro lixo !
E geralmente é uma embalagem “híbrida”: mistura uma coisa de metal com “não sei o quê” na base (aquilo que a gente rompe para liberar o medicamento”, com plástico mais resistente que envolve e “transparece” o medicamento por cima:
· Para entender o problema disso ... você já deve ter visto várias notícias de roubo de fios (cabos) ... porque o “ladrão” vende o metal;
· Por isso rouba cabos de energia, em que o isolante (o plástico) é muito pouco em relação ao total do produto, e fácil de ser separado ... derretendo o plástico, que é pouco, o metal, que é muito, “sobrevive” !
· Note que não roubam cabos de telecomunicações: os que são de fibra de vidro não tem metal para ser vendidos, justamente por serem de fibra de vidro e não de metal ... e nos de tecnologia mais antiga, que têm metal, é muito difícil separar o plástico, porque a quantidade de metal em relação a quantidade de “plástico” e papel (!!) é insignificante;
· Por isso roubam o que é fácil reciclar ... não roubam o que não é fácil ... custa mais caro derreter do que o que se vão conseguir com a venda do metal;
· Por que estamos citando isso ? ... estas embalagens “transgênicas” de medicamentos são como “cabos de telecomunicações” ... não existe “motivação econômica” para reciclar !!
O que se discute é o rumo que “o descartável” tomou na área da saúde ... foi e continua sendo absolutamente inadequado:
· Não se questiona o uso ... não é isso ... longe disso;
· É evidente o ganho assistencial que se tem com a sua utilização, como redução de riscos de infecção, controle de validade, rastreabilidade, segurança do paciente ...
· É mais do que evidente a diferença entre o risco de se manipular um vidro de 2 – 3 litros que pode quebrar, ou manipular medicamentos em tarjas ... “não tem cabimento” discutir isso !
· O que se questiona é a “desresponsabilização” dos envolvidos em prol do cálculo de custos que só considera “o seu umbigo” e esquece do dano ambiental ... o “custo ambiental”;
· O cálculo do custo na cadeia de valores não considera o custo do destino, o custo da reciclagem ... ninguém está realmente envolvido em se responsabilizar pelo custo de todo o ciclo ... com o custo da reciclagem !
· Como ninguém paga por isso, é claro que ninguém vai se interessar em reciclar ... desde quem produz, até quem utiliza e descarta ... é isso que necessita ser ajustado no “modelo descartável” desenvolvido pela área da saúde” !
É claro que:
· O custo para esterilizar uma agulha “no varejo” é muito maior do que comprar uma nova agulha “produzida no atacado”;
· O custo da logística de reposição e de lavar um lençol utilizado em uma maca de cada consulta em um consultório é muito maior do que utilizar papel descartável em rolo;
· O custo de lavar uma fralda de pano no varejo é muito maior que o de comprar fralda descartável produzida no atacado;
· Se o cálculo é feito desta forma, o descartável sempre vai “dar de lavada” no reutilizado !
E é claro que o risco que envolve a logística e manipulação do reutilizado não tem como ser menor que o do descartável, em qualquer situação !!
O problema é que na área da saúde não se cogita inserir no panorama o custo ambiental para que ele faça parte deste cálculo e ao mesmo tempo se preocupe em economizar e desenvolver modelos mais sustentáveis na cadeia de valores:
· Quanto custa implantar uma estrutura de coleta seletiva adequada ... realmente adequada, de ponta a ponta ?
· Quanto custa reciclar o material que vai pro lixo ?
· Quanto custa o dano causado no meio ambiente do material que não é reciclado ?
Se o produtor e quem utiliza não é responsabilizado pelo insumo poluente que gera ... nem se preocupa em responder estas perguntas ... nunca vamos mudar o cenário:
· Pneu, por exemplo, o fabricante tem que “recolher o vasilhame” (o usado) para vender um novo ... isso tem custo;
· Latas de refri, de cerveja ... foi criada uma cadeia de valores de reciclagem que recolhe tudo de volta para alimentar a cadeia de produção ... isso tem custo;
· Este custo é “aportado” na cadeia de valores “no atacado”, evidentemente elevando o preço de venda ... isso reduz o dano ao meio ambiente ... o dano é mitigado de “forma profissional” e sustentável distribuindo “o custo invisível para o consumidor” em toda a cadeia de valores ... o aumento do preço do produto em uma cadeia de valores inteligente como esta também é reduzido ... e “gera empregos”.
Seringa, agulha, máscara, fralda ... embalagens de medicamentos e outros insumos na área da saúde:
· A estrutura de reciclagem ainda é embrionária onde existe ... quem faz propaganda de que tem uma estrutura adequada para isso até merece consideração ... mas na realidade é insipiente quando analisamos sem viés de patrocínios ou marketing institucional ... onde existe, por mais tecnologia empregada, o ciclo ainda funciona de forma “amadora”;
· E é inexistente na maioria absoluta dos locais em todo o mundo !
· Você pode não ter reparado ... repare ... até nos seriados que mostram “heróis das câmeras” sobrevivendo em locais inóspitos aparece lixo hospitalar ... nos confins do mundo ... especialmente em praias desertas nos 5 oceanos do mundo, onde não existe a preocupação de “limpar para não atrapalhar o turismo” !
Ainda estamos “engatinhando” em coleta seletiva na área da saúde – somos completamente amadores nisso:
· Ainda temos rotina de coleta de lixo comum maior do que a de coleta seletiva;
· Isso ainda acontece em praticamente 100 % dos municípios brasileiros para a área da saúde;
· Tem “caminhão de lixo comum” passando todos os dias ... e o caminhão de coleta seletiva passando uma vez por semana !
· Mesmo sendo o lixo “facilmente reciclável” em volume ... já há muito tempo ... muito maior em volume do que o “lixo comum” !!
A questão ambiental no mundo é grave ... já estamos sentindo os efeitos há alguns anos:
· É irreversível ... não podemos eliminar o problema, mas podemos mitigar os danos se a consciência mudar;
· E infelizmente, em uma época de tanta “ideologia barata” governando o mundo, a consciência só muda se “doer no bolso” de alguma forma ... não existe motivação se não envolver penalidades ... não adianta ser ingênuo e pensar o contrário ... conscientização real vai demorar “umas boas décadas” para deixar de ser discurso e se tornar realidade;
· Precisa doer no bolso inclusive dos órgãos governamentais, responsabilizando os políticos irresponsáveis através de processos administrativos que obriguem o órgão e o servidor público a ressarcir os danos que causa por negligência ou de forma dolosa !
Nossa consciência ambiental ainda nem “debutou”:
· Você não se sente um alienígena quando utiliza máscara de pano ? ... especialmente as que não foram compradas “na semana passada” e já estão “um bocadinho desbotadas” ?
· As pessoas olham com aquele olhar de reprovação: “caramba ... não tem dinheiro para usar máscara descartável ?
· O que custa lavar máscaras reutilizáveis ? ... é tão ruim assim ?
· Cada um de nós ... se contabilizarmos quantas descartamos desde o início da pandemia ... e ainda vamos descartar por muito tempo, porque o novo normal nunca mais será o mesmo ... se fizermos a conta do quanto mediriam se estivessem enfileiradas: já pensou nisso ?
· Acontece com as máscaras tudo que acontece com a sociedade consumista que nos moldou durante décadas ... usar roupa velha e/ou que “não está na moda” e/ou que “não é de marca” ... “queima o filme” !
· Então descartamos “um zilhão” de coisas desnecessariamente, sem nos preocupar com o destino !!
Com a saúde acontece a mesma coisa ... e a saúde polui muito ... “hospital” que é a instituição que me encantou a ponto de mudar minha atuação profissional é “um porcalhão ambiental na essência” !
A “cúpula ambiental” do ano passado ... os reflexos ambientais que nem mesmo “os mais ferrenhos negacionistas” estão conseguindo “desmentir” ... as coisas que deixaram de ser tendências para se firmarem como realidade, a ponto de passarmos a ver corridas de automóveis que “não fazem barulho”, não utilizam combustíveis fósseis e obrigam o piloto a poupar ao invés de “não ter limites” ... evidências de que não tem como a saúde escapar da mira do ambientalismo !
· Em uma forma parecida com a de uma “inquisição ambiental na saúde” ... doendo no bolso dos “culposos” e penalizando severamente os “dolosos”;
· Porque é urgente rever o “modelo descartaveloso” atual da saúde que só considera custos que interessam para “o agora” e deixa para as gerações futuras a solução de um problema que deveríamos ter colocado na nossa agenda já há alguns anos, mas não fizemos !!!
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Sobre o autor Enio Jorge Salu
Histórico Acadêmico
· Formado em Tecnologia da Informação pela UNESP – Universidade do Estado de São Paulo
· Pós-graduação em Administração de Serviços de Saúde pela USP – Universidade de São Paulo
· Especializações em Administração Hospitalar, Epidemiologia Hospitalar e Economia e Custos em Saúde pela FGV – Fundação Getúlio Vargas
· Professor em Turmas de Pós-graduação na Faculdade Albert Einstein, Fundação Getúlio Vargas, FIA/USP, FUNDACE-FUNPEC/USP, Centro Universitário São Camilo, SENAC, CEEN/PUC-GO e Impacta
· Coordenador Adjunto do Curso de Pós-graduação em Administração Hospitalar da Fundação Unimed
Histórico Profissional
· CEO da Escepti Consultoria e Treinamento
· Pesquisador Associado e Membro do Comitê Assessor do GVSaúde – Centro de Estudos em Planejamento e Gestão de Saúde da EAESP da Fundação Getúlio Vargas
· Membro Efetivo da Federação Brasileira de Administradores Hospitalares
· CIO do Hospital Sírio Libanês, Diretor Comercial e de Saúde Suplementar do InCor/Fundação Zerbini, e Superintendente da Furukawa
· Diretor no Conselho de Administração da ASSESPRO-SP – Associação das Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação
· Membro do Comitê Assessor do CATI (Congresso Anual de Tecnologia da Informação) do Centro de Tecnologia de Informação Aplicada da Fundação Getúlio Vargas
· Associado NCMA – National Contract Management Association
· Associado SBIS – Sociedade Brasileira de Informática em Saúde
· Autor de 12 livros pela Editora Manole, Editora Atheneu / FGV e Edições Própria
· Gerente de mais de 200 projetos em operadoras de planos de saúde, hospitais, clínicas, centros de diagnósticos, secretarias de saúde e empresas fornecedoras de produtos e serviços para a área da saúde e outros segmentos de mercado