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Hospital Faz de Conta que Controla Estoque e Não Usa, ou Erra no Uso, do Kanban
0258 – 22/02/2022
Referências: Geografia Econômica da Saúde no Brasil e Jornada da Gestão em Saúde no Brasil
Vincular o sucesso do controle do estoque priorizando a prescrição é o maior erro da gestão da logística hospitalar
(*) todos os gráficos e ilustrações são partes integrantes do Estudo Geografia Econômica da Saúde no Brasil e do material didático dos cursos da Jornada da Gestão em Saúde e da Escepti
Estas fotos têm em comum:
· Tiradas recentemente em hospitais;
· De hospitais que “se orgulham” de possuir um controle de estoques “muito bons”;
· Todos com sistemas informatizados para controlar os estoques, incluindo a dispensação da farmácia ... a movimentação de estoques “no varejo assistencial”;
· Em todos os conceitos “Kanban”, “Kaizen” e “Monomossu” ... na prática ... inexistem !
Nestes “pontos de estoque das figuras”:
· Ou não existem no sistema, porque a saída “é a Centro de Custo” ... ou seja ... é um “buraco negro” em que não se avalia se a reposição está proporcional à atividade assistencial;
· Ou são “subestoques no sistema” em que pelo menos uma vez por semana se faz um inventário de ajuste ... e se ajusta para “bater o estoque no sistema” que vai “desbater no minuto seguinte” em que o inventário foi feito !
O resultado é o efeito adverso que em “Lean” ... este efeito adverso aprendemos a chamar de “Dishuken” !!
· Estes hospitais pensam que existe controle seguro nos processos ... que estão seguros ... e isso impede que eles estimem o erro de forma adequada !
· Se o controle fosse desenvolvido considerando “erros estimados” ... “erros conhecidos” ... não gastariam tanto com o controle de algo que na prática não funciona !!!
· Sem considerar que o controle é falho, e que alguns controles não compensam o resultado que se deseja deles ... fazendo de conta que o que está nas fotos não existe ... acabam escondendo o erro ... e não sabem estimar o tamanho dele ... e, pior, não inserem na agenda a dinâmica de melhoria contínua do processo ... o erro vai perpetuando e/ou agravando !
Ainda quando era “executivo de carreira” na área da saúde, aprendi que visitar um hospital guiado pela área de marketing, ou por áreas especializadas em mostrar o que o hospital tem de bom:
· É muito diferente de observar um hospital trabalhando nele ... realizando uma consultoria ... interagindo para desenvolver à quatro mãos o redesenho de controles ... um programa de capacitação ...
· Guiado na visita a tendência é ver tudo que existe de bom ... a tendência é preparação da visita para que vejam “o tapete limpo ... porque não existe a preocupação de limpar o que está debaixo dele”;
· Sem estar guiado na visita a gente vê a rotina ... o cotidiano ... vê “o pó debaixo do tapete”.
Enfim, quando a instituição não vê voce como um auditor e sim como alguém que vem para auxiliar, não se prepara para mostrar somente aquilo que “não queima o filme”:
· E é aberta a possibilidade de observar coisas que nem têm a ver com o foco do seu trabalho;
· Como, por exemplo, voce está estudando o fluxo de atendimento dos pacientes, de faturamento das contas, de compliance de documentos, de contratos com operadoras ... os interlocutores naturalmente acabam não se importando com o que estamos vendo em relação ao controle de estoques ...
A pandemia e a tendência de “empacotamentos” de alguns preços na saúde “escancarou” a métrica de que os serviços de saúde, na média, controlam muito mal seus estoques ... explicando ...
Desde o início da pandemia alguns itens de baixo custo ... as máscaras e luvas por exemplo ... tiveram aumento de custo e consumo médio elevadíssimo:
· Não somente EPIs, insumos para higienização como álcool, e alguns medicamentos prescritos (ou não!!!) preventivamente aos primeiros sintomas que podem sugerir a contaminação pelo COVID-19, mesmo antes da confirmação do diagnóstico ...
· É bom que se diga que esta mudança de perfil de consumo “veio para ficar” ... quando a pandemia acabar serviços e profissionais de saúde vão continuar “se cuidando mais do que se cuidavam” antes da pandemia;
· A pandemia incorporou um aspecto “pedagógico” que era reivindicado pela CCIH “há séculos” ... na prática muitos dos cuidados que a CCIH desejava sempre foram “odiados em verso e prosa” pelos profissionais que atuam no segmento;
· Antes tidos como “uma chatice desnecessária”, boa parte deles ficou bem evidente se tratar de “coisa mais do que necessária” !
· Especialmente nos hospitais, este aumento foi “estratosférico”, gerando desequilíbrio na oferta e procura ... e consequentemente aumento abusivo de preços.
Por que aumento abusivo ?
· Qualquer insumo, em qualquer segmento de mercado, inclusive na área da saúde, quando tem seu consumo elevado o preço de venda naturalmente cai ... como quando voce vai na loja, no bar, no mercado e paga preço menor quando compra “mais de um” ... o famoso “desconto” que diminui o lucro em “cada peça”, compensado pelo lucro somado na venda de “todas as peças” !
· Mas quando o consumo se eleva a ponto de acabar com o estoque disponível para venda, o preço naturalmente se eleva porque tem gente disposta a pagar mais para não ficar sem ... e alguns “vendedores” podem aproveitar a oportunidade para exagerar “na ganância” de obter mais lucro ... abusando ...
· Vimos isso em “milhares” de situações “fartamente” divulgadas pena mídia ... desde máscaras lá no início, passando pelos anestésicos para “entubação”, oxigênio, e uma infinidade de insumos ... até chegar mais recentemente nos testes rápidos para diagnóstico de COVID-19 em farmácias !
Acrescido a isso, os “empacotamentos” têm cada vez mais frequência na negociação dos contratos entre operadoras de planos de saúde e serviços de saúde:
· O fechamento de preço, por exemplo, de uma diária que inclui MAT/MED ...
· Empacotamentos como este têm tido muito mais sucesso do que as Contas Tipo Pacote ... por exemplo: parto, herniorrafia ... onde uma infinidade de combinações de fatores mercadológicos associados ao despreparo das operadoras e dos hospitais em definir adequadamente este tipo de pacote acabam reduzindo a viabilidade do avanço ... algo de muito potencial, que na prática ainda é pouco aplicado “por insegurança”;
· De qualquer forma, empacotamentos ou pacotes incluem no preço, entre outras coisas, os insumos de baixo custo que deixam de serem listados na composição da conta, ou seja, se voce gastar mais do que o necessário ... “azar o seu” !
Bem ... ainda tem administrador hospitalar que acredita em discursos ... principalmente de vendedores de sistemas hospitalares ... de que:
· A base para controlar os estoques é 100 % a prescrição;
· E que “amarrando” o que cai na conta do paciente ao controle de estoques “tudo se resolve” ... que o faturamento vai corrigir a ineficiência do hospital de controlar adequadamente seus estoques;
· “Anos e anos” se passaram desde a primeira vez que esta “narrativa” começou;
· Anos e anos se passaram e isso não deu certo “da forma como foi vendido”;
· Anos e anos se passaram e continuamos a tirar fotos como aquela lá em cima ... depois do hospital “ter gastado os tubos” com algo que na teoria é “lindo e maravilhoso”, percebeu na prática que a realidade é um pouco diferente do que está nos livros ... que a teoria se aplica 100 % na teoria ... nas na prática não aplicar 100 % da teoria é necessário !
Na maioria absoluta dos hospitais ... com exceção apenas dos “exclusivamente muito especializados” em determinados procedimentos ... em determinadas especialidades:
· A maioria absoluta dos atendimentos são externos, ou seja, não são de internação ... e nestes atendimentos a maioria dos insumos (falando sobre variedade de itens e não em volume de consumo) não é prescrita, e nem é possível com precisão associar todos às prescrições. Na média atendimentos externos são mais de 80 % do total de atendimentos hospitalares;
· Como discutimos acima, mesmo nas internações, se existem a prática de precificação por contas tipo pacote ou empacotamentos, o que vai ser faturado não tem nada a ver com o fluxo acima ... vai ser faturado o item com preço negociado (o pacote e/ou o empacotamento) que não é prescrito ... atualmente, na média, perto de 10 % dos itens são empacotados, ou seja, mais de 90 % dos itens que movimentam estoques não está nas contas faturadas;
· E é bom lembrar que nas internações, quando o sistema de financiamento é SUS, a maioria absoluta dos medicamentos e todos (todos) os materiais descartáveis não são faturados em contas ... se o hospital só atende SUS aí que esta tentativa de corrigir o controle do estoque a partir do faturamento é absolutamente “fora de questão”;
· E as coisas não são simples como pensam os analistas do fornecedor de TI ... quando um hospital atende SUS e Saúde Suplementar simultaneamente, SUS representa, no mínimo, 60 % do total de atendimentos;
· Juntando todas estas coisas que comentamos agora ... a maioria absoluta destes analistas não têm experiência prática em hospitais para avaliar o impacto da integração faturamento x estoques em cada hospital que presta consultoria, porque tem um roteiro a seguir de acordo com um padrão ideal de implantação ... e se não seguir: “perde o emprego” !
Portanto, somando todos os fatores acima, quando o faturamento é a base “da auditoria do consumo” o hospital fica “vigiando a formiguinha pela frente e deixando a manada de elefantes passar pelas costas” !
Este tipo de fluxo onde todo o estoque é controlado a partir da produção ... das vendas ... perfeito sob o ponto de vista teórico:
· Adere “como uma luva” na indústria e no comércio, onde é possível associar diretamente “cada parafuso” ao que se se fabrica e que vende;
· Mas não adere da mesma forma na área da saúde onde “tem paciente que falta 1 parafuso na cabeça, em outro falta 2, em outro falta 3” ... e nem sempre se cobra “pelos parafusos” que foram utilizados ... na verdade, nem sempre é possível controlar com exatidão quantos parafusos foram utilizados, até porque este controle pode ser mais caro do que o custo do parafuso !
· Não dá para controlar estoques em hospitais com eficiência achando que o fluxo “vai se encaixar” da mesma forma !!
O fluxo de controle dos insumos no tratamento dos pacientes não pode ser o mesmo da produção na indústria ... da venda de mercadorias no comércio !
Pedir para a enfermagem devolver no sistema uma infinidade de materiais de baixíssimo custo ... de uma infinidade de medicamentos em doses unitárias ... de coisas que não foi ela quem prescreveu;
· Além de ser um contrassenso, em se tratando de empenhar mão de obra caríssima para realizar tarefa que demanda baixíssima especialização;
· Além de ser um contrassenso desviar tempo de profissional assistencial da assistência do paciente para dar baixa em estoque de material de baixíssimo custo;
· Ainda ... é mais inadequado ao constatar que com tudo isso ainda não eliminamos o problema e constatamos ao ver o que aparece “nas fotos lá da primeira figura” !
Achar que a enfermagem vai dar mais atenção ao controle do estoque do que à ministração do medicamento ... da dor que o paciente está sentido ... da interação com acompanhantes do paciente (boa parte “muito chatos”) que ficam opinando sobre coisas que não conhecem, mas “viram na Internet” ... dos controles que o conselho profissional obriga que ela realize ... enfim ... desviar o foco da enfermagem do assistencial ...
· Só se deve fazer isso ... desviar o profissional assistencial da atividade assistencial ... quando o custo x benefício compensa ... caso contrário, qual o ganho que se está tendo ?
· Só se deve fazer isso, ou com insumos de alto custo, ou quando esta atividade estiver absolutamente permeada de um processo infalível e que não prejudique a atividade fim da enfermagem;
· Isso vale para o envolvimento de qualquer profissional assistencial nos processos de controle de estoque ... é claro ... não somente a enfermagem: médicos, fisioterapeutas, nutricionistas ... são profissionais muito caros para controlar estoques de “bolinhas de algodão”, “abaixadores de língua”, “agulhas e seringas” ... !
Considerando que:
· Não é possível associar com exatidão antecipadamente os insumos que serão utilizados no tratamento ...
· O controle da maior variedade de insumos se refere a itens de baixo custo ...
· O custo do controle ... do empenho de mão de obra para controlar ... pode ser mais elevado que o próprio custo do insumo “descaminhado” ...
· ... considerando isso ... é que uma alternativa viável é Kanban !
Kanban é uma alternativa viável porque:
· Distribui a responsabilidade pelo uso consciente e pela vigilância do descaminho aos responsável pela unidade de negócios – quem utiliza o insumo;
· Mas mantém a responsabilidade pelo controle com a área de suprimentos, que analisa o consumo, compra e distribui;
· E reduz absurdamente o empenho de mão de obra nos controles, e consequentemente o custo do controle de estoques.
Chega a ser engraçado o que se pensa sobre Kanban:
· Um sistema informatizado ...
· ... um método complexo que para ser “bem implantado” obrigatoriamente necessita da existência de um profissional certificado "pink belt" ...
· ... um processo que usa “fichinhas coloridas ou post it's";
· Pensam um "monte de lendas" que os "vendedores de vapor" contam para "faturar em consultorias”.
E na verdade Kanban, como o próprio significado da palavra sugere (quando inserida no contexto Lean), é apenas um "modo de pensar", como os outros conceitos do Lean:
· Sinalizando que algo ou deu, ou pode dar, errado;
· É uma "ferramenta" para melhorar processos ... não é um processo;
· Não é um sistema de controle de estoques ... é um conceito que aplicamos, também em sistemas de controle de estoques ... mas na verdade aplicamos muito na saúde em uma infinidade de controles que não têm nada a ver com estoques !
Em estoques aplicamos com muita eficiência nos itens de baixo custo e alto giro:
· E no caso dos insumos de alto custo e baixo giro, aplicamos aquele fluxo “ali em cima que liga a produção diretamente aos estoques” ... porque nestes casos o custo do controle geralmente é infinitamente menor que o custo do insumo;
· E assim, aquilo que vemos nas fotos lá em cima ... que o administrador pensa ou faz de conta que não existe ... passa a existir de verdade ... porque existe na verdade ... e um controle baseado em Kanban é associado aos insumos que aparecem nas fotos ... “damos vida ao controle deles” de forma bem simples e barata !
· Na terminologia Lean: baixo custo fica com Kanban e o alto custo mapeado (Jishuken) fica com o fluxo ... eliminamos o Dishuken neste caso !
Que empacotamentos e pacotes já estavam chamando a atenção dos administradores hospitalares para o tema não é novidade alguma ... mas quem diria que COVID-19 seria “o ultimato” para esta discussão !
Uma adversidade, como está sendo a pandemia, está fazendo os gestores aprenderem a “fazer do limão uma limonada” !!
Gestão da saúde não é mesmo “algo fantástico” para quem está atento, e não se prende ao “nó que os vendedores” tentam dar na realidade ?
Conheça os cursos da Jornada da Gestão em Saúde www.jgs.net.br !
Conheça o estudo Geografia Econômica da Saúde no Brasil, e os seminários temáticos www.gesb.net.br !
Informações adicionais contato@escepti.com.br !
Sobre o autor Enio Jorge Salu
Histórico Acadêmico
· Formado em Tecnologia da Informação pela UNESP – Universidade do Estado de São Paulo
· Pós-graduação em Administração de Serviços de Saúde pela USP – Universidade de São Paulo
· Especializações em Administração Hospitalar, Epidemiologia Hospitalar e Economia e Custos em Saúde pela FGV – Fundação Getúlio Vargas
· Professor em Turmas de Pós-graduação na Faculdade Albert Einstein, Fundação Getúlio Vargas, FIA/USP, FUNDACE-FUNPEC/USP, Centro Universitário São Camilo, SENAC, CEEN/PUC-GO e Impacta
· Coordenador Adjunto do Curso de Pós-graduação em Administração Hospitalar da Fundação Unimed
Histórico Profissional
· CEO da Escepti Consultoria e Treinamento
· Pesquisador Associado e Membro do Comitê Assessor do GVSaúde – Centro de Estudos em Planejamento e Gestão de Saúde da EAESP da Fundação Getúlio Vargas
· Membro Efetivo da Federação Brasileira de Administradores Hospitalares
· CIO do Hospital Sírio Libanês, Diretor Comercial e de Saúde Suplementar do InCor/Fundação Zerbini, e Superintendente da Furukawa
· Diretor no Conselho de Administração da ASSESPRO-SP – Associação das Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação
· Membro do Comitê Assessor do CATI (Congresso Anual de Tecnologia da Informação) do Centro de Tecnologia de Informação Aplicada da Fundação Getúlio Vargas
· Associado NCMA – National Contract Management Association
· Associado SBIS – Sociedade Brasileira de Informática em Saúde
· Autor de 12 livros pela Editora Manole, Editora Atheneu / FGV e Edições Própria
· Gerente de mais de 200 projetos em operadoras de planos de saúde, hospitais, clínicas, centros de diagnósticos, secretarias de saúde e empresas fornecedoras de produtos e serviços para a área da saúde e outros segmentos de mercado