Boletim    noticia.net.br Conteúdo para Gestores da Área da Saúde
 

 

 


Não é porque SUS e Operadora não pagam que não se deve usar

0259 – 27/02/2022

Referências: Geografia Econômica da Saúde no Brasil e Jornada da Gestão em Saúde no Brasil

Um dos mitos da gestão da saúde ... difícil de quebrar se a capacitação do gestor não é adequada

 

(*) todos os gráficos e ilustrações são partes integrantes do Estudo Geografia Econômica da Saúde no Brasil e do material didático dos cursos da Jornada da Gestão em Saúde e da Escepti

Sou testemunha “ainda viva” da evolução da gestão da saúde no Brasil:

·         Temos excelentes gestores tanto na saúde privada como na pública ... tanto na fonte pagadora, como no serviço de saúde, como no fornecedor, como no intermediador ...

·         Mas ainda temos muitos gestores despreparados quando o tema é gestão de custos, de precificação, de rentabilidade;

·         Ainda não formamos a massa de gestores necessária para suprir a demanda de ~515.000 (*) instituições que atuam na área da saúde ...

·         (*) e neste número nem se contam fornecedores de insumos ... medicamentos, materiais, equipamentos, serviços especializados ... sabe-se lá quantos eles somam !

Ainda “falta gente” adequadamente capacitada no tema para o tamanho da área da saúde !!

O foco da gestão da saúde é fazer o máximo possível com o limitado recurso financeiro que existe, e assim dar o maior acesso possível à saúde para os beneficiários do SUS, da operadoras de planos de saúde, e dos particulares:

·         Com este foco, não é viável que a gestão seja imediatista ... a visão restrita de economia no curto prazo pode significar grande gasto no médio e longo prazos ... gasto que fica “escondido” pela necessidade exclusiva de não fechar o próximo balanço “no vermelho”;

·         Infelizmente muitos gestores foram “formados” para analisar custos com esta visão de curto prazo ... este é um dos mitos que temos que trabalhar para quebrar ... “para o bem da saúde” ... e da sustentabilidade real das instituições que atuam na área da saúde.

Um destes mitos se refere a deixar de utilizar uma tecnologia mais cara, comparando com a mais barata apenas no evento que financia a sua utilização ... é sobre isso, e apenas sobre isso, que este texto propõe discussão !

 

 

É necessário avaliar o que significa a tecnologia no ciclo de atenção do paciente, e não isoladamente em um evento ... o exemplo mais simples é “mais que famoso”:

·         Se existe um cateter para ministrar medicação por um longo período de utilização, não se pode comparar o preço do cateter com o preço das seringas e agulhas apenas no evento inicial ... o que implanta o cateter;

·         O custo do cateter deve ser avaliado em relação ao das seringas e agulhas durante todo o ciclo de atendimento, acrescendo o custo de todas as intercorrências que são evitadas com a utilização do cateter ... acrescendo o custo do consumo de medicamentos para tratar as reações adversas de “transformar a pele do paciente em peneira” ... do custo da mão de obra utilizada para ficar “picando repetidamente o paciente” ... do “transtorno mensal” que a tensão de “ser picado diariamente” traz para o paciente que pode exigir tratamento do transtorno ...

·         Não é a substituição simples de um insumo que custa 10 por um que custa 1 ... é a análise da utilização de um que custa 10 por uma série de eventos que individualmente custam menos que 10, mas que no total podem custar 20 ... 30 ... !

Um parênteses mais que necessário:

·         O objetivo aqui não é defender o uso de cateteres ao invés de agulhas e seringas ... não tenho o menor interesse nisso ... aliás, a falta de interesse em defender técnicas até já me custou algum mal-estar em episódios da minha vida profissional, é bom que se diga;

·         E o objetivo aqui não é discutir o aspecto assistencial da utilização de uma coisa ou de outra ... não tenho formação assistencial ... “zero de vocação” para isso ... e nenhuma competência para entrar neste tipo de discussão;

·         O foco aqui é discutir que avaliar o custo na saúde não é somente comparar “o preço da moto com o preço do carro” ... é avaliar se a economia da compra de um no lugar do outro compensa o gasto com o tratamento dos traumas que ocorrem mais em um caso do que em outro ... do risco de ser assaltado e ficar a pé no meio da rua em um semáforo ... do prejuízo que se pode ter em não poder se locomover em dias de chuva forte ... no gasto com a roupa especial para dirigir a moto para se proteger ... ou seja, “somar todos os prós e contras” comparando custos e benefícios ... não somente o preço de aquisição e os valores de licenciamento e IPVA ... e nem tampouco comparar o prazer de dirigir um ou outro, que é uma mera “questão subjetiva” !

Isso posto ...

 

 

O gestor de saúde mal preparado acha que só pode utilizar tecnologia mais cara se puder “jogar” na conta aberta ... mas a decisão pode ser exatamente pelo contrário:

·         É justamente quando a fonte pagadora não paga em conta aberta ... quando o insumo está inserido em um pacote ou empacotamento, que a análise custo x benefício é mais necessária e deve ser mais criteriosa !

·         Do lado da operadora, por exemplo, acho que não existe dúvida que economizar no “arroz, feijão e salada de cada dia para comer hot dog”, e depois gastar muito depois com o tratamento da doença gástrica pelo excesso de consumo de “maionese industrial, catchup e mostarda” não faz o menor sentido !!

·         É melhor a operadora precificar o pacote de forma que o prestador não economize pensando no curto prazo, porque se tiver maior gasto no médio e longo prazo “é mais pior” para a fonte pagadora do que para o prestador de serviço ... afinal, depois, o serviço de saúde vai “ganhar” um serviço extra para fazer por conta de uma economia que a operadora quis fazer pensando no imediatismo;

·         E do lado do serviço de saúde é que os gestores se confundem mais: já que o valor é fixo, ele mais do que ninguém, deve avaliar se durante o ciclo de atendimento vale a pena usar o insumo mais caro no início para compensar depois. É justamente para isso que serve o compartilhamento de risco (contratualização, pacote, empacotamento ...) !

A regra básica é que uma tecnologia custa mais caro que a outra porque o resultado que gera é diferente:

·         A “indústria” não vai produzir algo que exige mais investimento e/ou insumos, e consequentemente custe mais caro, se existe algo mais barato que produza o mesmo resultado !

·         É claro que existem situações em que se utiliza uma tecnologia mais cara quando poderia se utilizar uma mais barata para produzir o mesmo resultado ... não se discute que este cenário não exista;

·         Mas achar que sempre a tecnologia mais cara é utilizada indevidamente, e o resultado é o mesmo de uma tecnologia mais barata é um erro que não se pode cometer !

·         Um ditado antigo costuma “cair bem” nesta discussão: “bom e barato até existe ... mas que é difícil de encontrar ... ah isso é !!”

 

 

Esta lógica para o serviço de saúde é “mais indiscutível” quando falamos do contrato que ele tem com o SUS:

·         Se o serviço é contratualizado, ganha “uma mesada” para cuidar de uma determinada carteira ... para cumprir determinadas metas assistenciais;

·         Não importa se a conta do SUS inclui ou não determinados insumos ... o repasse da contratualização é a mesmo;

·         E o paciente atendido hoje na internação, ontem veio fazer o pré-operatório, e depois vem fazer a reabilitação ... se tudo der certo, não haverá reoperação ... apesar das contas serem individuais, “o dinheiro” total é o mesmo;

·         Então a lógica não é pensar somente no valor de cada conta individualmente ... em economizar o máximo na conta ... é pensar no paciente ... economizar ao máximo no ciclo de atendimento dele !

Então ... de novo usando o exemplo do cateter ... vou gastar 100 para inserir o cateter e ter menos eventos com o paciente ... ou vou economizar 90 e ter um monte de eventos com o paciente, “picando ele” várias vezes, empenhando um monte de insumos para picar e tratar os efeitos da picadeira ... que “no fim da história” acaba custando muito mais que 100 ?

Analisar se vale a pena ou não utilizar o cateter ... mesmo que ele não seja lançado em conta ... se não existe na tabela SIGTAP ... gerenciar o custo no ciclo de atendimento:

·         Porque as dúzias de agulhas e seringas o SUS também não vai pagar também !

·         O repasse para custear a mão de obra da contratualização é o mesmo ... se passar o cateter ou picar 50 vezes o paciente ... e vou gastar muito mais em mão de obra picando 50 vezes o paciente do que passando o cateter !!

Ou seja:

·         Mesmo que o insumo não seja lançado em conta para pagamento contra apresentação, a análise de custo é necessária ... sempre ... com olhar de gestor ... conhecendo o negócio ... e é claro, com o apoio da área assistencial que pode até não saber calcular custos adequadamente, mas “conhece o caminho das pedras” para avaliar o resultado !

·         ... portanto a minha habilidade de gestor é medida pela capacidade de saber se o custo do ciclo de atendimento é menor na opção A ou B ... e não somente se o item é cobrado ou não ... se existe na tabela ou não.

 

 

Ilustramos com cateter porque é algo mais fácil para um “leigo” na área assistencial, como eu, entender:

·         Mas existe uma infinidade de casos como este;

·         Não paga colchão casca de ovo, então não usa ... e dá-lhe custo elevado para o tratamento de feridas no paciente;

·         Não paga mais do que “x sessões de fisio” ... e gasta “um zilhão” com consultas de retorno no ortopedista para prescrever e autorizar novos blocos de “x sessões de fisio” !

·         Não paga equipamentos para fisio respiratória e acaba gastando com mais sessões de fisio sem o suporte adequado de equipamentos necessários !!

·         Não paga medicamento de alto custo e gasta mais com tratamentos mais prolongados e com maior índice de intercorrências e/ou efeitos colaterais.

O gestor menos preparado é o que só pensa na associação de utilizar o que existe na tabela de preços ... que pode ser cobrado na conta aberta:

·         Este é um critério que só serve para evitar uma análise mais aprimorada ... e necessária;

·         Se o gestor emprega esta associação como “fator pétreo”, é um sinalizador de que na verdade ele deve buscar aperfeiçoar seus conceitos de gestão ... rapidamente, diga-se de passagem;

·         A gestão de custos e precificação na saúde não é um evento isolado de venda de um atendimento pontual ... exige uma visão mais ampla;

·         E é bom ressaltar que há complexidade nisso: é uma mera questão de analisar o contexto ... fazer isso “com método” !

Como discutido, esta visão é exigida para quem está “em qualquer dos dois lados da mesa de negociação”:

·         Nos casos de pacotes fica claro que não é somente o serviço de saúde que deve avaliar o resultado;

·         A operadora também, se estiver com foco na qualidade assistencial para seus beneficiários, e não na última linha do próximo balanço patrimonial;

·         E nos casos de conta aberta, como discutido, a lógica é exatamente a mesma ... a sinistralidade do paciente não se resume a 1 única conta, mas em todas as contas pagas pela operadora.

E também no SUS, para incorporar novas tecnologias:

·         De uma forma ou de outra a ineficiência vai pesar na próxima negociação da contratualização;

·         A produção total que o serviço utiliza para justificar o repasse inclui o ciclo todo de atendimento !

·         E o SUS vai acabar pagando mais caro por uma “economia negligente” !!

A forma de apresentar a conta, aberta ou fechada ... se a tabela de preços inclui ou não o item ... são apenas dois dos parâmetros da análise ... importantes ... mas nunca os únicos !

Conheça os cursos da Jornada da Gestão em Saúde     www.jgs.net.br   !

Conheça o estudo Geografia Econômica da Saúde no Brasil, e os seminários temáticos     www.gesb.net.br     !

Informações adicionais     contato@escepti.com.br  !

 

Sobre o autor Enio Jorge Salu

Histórico Acadêmico

·  Formado em Tecnologia da Informação pela UNESP – Universidade do Estado de São Paulo

·  Pós-graduação em Administração de Serviços de Saúde pela USP – Universidade de São Paulo

·  Especializações em Administração Hospitalar, Epidemiologia Hospitalar e Economia e Custos em Saúde pela FGV – Fundação Getúlio Vargas

·  Professor em Turmas de Pós-graduação na Faculdade Albert Einstein, Fundação Getúlio Vargas, FIA/USP, FUNDACE-FUNPEC/USP, Centro Universitário São Camilo, SENAC, CEEN/PUC-GO e Impacta

·  Coordenador Adjunto do Curso de Pós-graduação em Administração Hospitalar da Fundação Unimed

Histórico Profissional

·  CEO da Escepti Consultoria e Treinamento

·  Pesquisador Associado e Membro do Comitê Assessor do GVSaúde – Centro de Estudos em Planejamento e Gestão de Saúde da EAESP da Fundação Getúlio Vargas

·  Membro Efetivo da Federação Brasileira de Administradores Hospitalares

·  CIO do Hospital Sírio Libanês, Diretor Comercial e de Saúde Suplementar do InCor/Fundação Zerbini, e Superintendente da Furukawa

·  Diretor no Conselho de Administração da ASSESPRO-SP – Associação das Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação

·  Membro do Comitê Assessor do CATI (Congresso Anual de Tecnologia da Informação) do Centro de Tecnologia de Informação Aplicada da Fundação Getúlio Vargas

·  Associado NCMA – National Contract Management Association

·  Associado SBIS – Sociedade Brasileira de Informática em Saúde

·  Autor de 12 livros pela Editora Manole, Editora Atheneu / FGV e Edições Própria

·  Gerente de mais de 200 projetos em operadoras de planos de saúde, hospitais, clínicas, centros de diagnósticos, secretarias de saúde e empresas fornecedoras de produtos e serviços para a área da saúde e outros segmentos de mercado