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Ressarcimento das Operadoras ao SUS - Gestores nos 3 Sistemas de Financiamento da Saúde
0287 – 25/07/2022
Referências: Geografia Econômica da Saúde no Brasil e Jornada da Gestão em Saúde no Brasil
Uma péssima regulação exige dos gestores a ampliação da sua visão do mercado da saúde
(*) todos os gráficos e ilustrações são partes integrantes do Estudo Geografia Econômica da Saúde no Brasil e do material didático dos cursos da Jornada da Gestão em Saúde e da Escepti
Em junho tivemos “a primeira perna” da Jornada da Gestão em Saúde do terceiro trimestre de 2022 e, nesta perna, tive a honra de interagir com mais de 200 gestores de operadoras de planos de saúde, fornecedores de insumos, e hospitais públicos e privados, para discutir o mercado da saúde (gestão comercial na saúde privada e pública) e o faturamento das contas de alta complexidade na saúde suplementar e no SUS.
Sempre me sinto confortado em saber que cada vez mais gestores se empenham em conhecer as bases dos 3 sistemas de financiamento:
· SUS, Saúde Suplementar Regulada pela ANS e Saúde Suplementar Não Regulada;
· Porque “foi-se o tempo” em que alguém podia dizer: quero ser gestor em saúde no SUS e a Saúde Suplementar não me interessa ... ou vice-versa;
· Os 3 sistemas estão interligados ... e especialmente no que diz respeito à saúde suplementar regulada: uma regulação inadequada ... todos que são obrigados a “mergulhar” nela para sobreviver precisam saber que existem situações que “a pederneira e o cantil” não basta para sobreviver ... conhecer o sistema de financiamento prioritário da sustentabilidade da sua empresa é fundamental, mas precisamos estar atentos aos demais para “conseguir a água para ferver e colocar no cantil” ... a sustentabilidade na área da saúde envolve diversos cenários !
O ressarcimento das operadoras ao SUS é uma destas regulações que criaram um “sistema hostil” para os gestores:
· As operadoras que “estavam lá na saúde suplementar” e diziam “Deus me livre de ter que interagir com o SUS” ...
· ... as operadoras que não têm gestores que conhecem as regras de remuneração com o SUS ...
· ... estão “gastando muito mais que da conta”, como se diz no interior de Minas Gerais !
Vamos lembrar a dinâmica do ressarcimento das operadoras ao SUS ? ... acho que é oportuno para “iniciar a prosa” ...
Quando um beneficiário de plano de saúde é atendido na rede pública financiada pelo SUS:
· O serviço de saúde, como faz com todas as contas, envia “a cobrança” para o SUS pagar ...
· Não importa se o modelo de remuneração é “orçamento contratualizado” ou “contra apresentação” ... a conta é sempre enviada pelo serviço para o SUS;
· Se o serviço de saúde “trabalhou” adequadamente a conta, identifica o CPF do paciente; (*1)
· A base de dados o SUS é “cruzada” com a base de dados de beneficiários da ANS;
· Se o atendimento se enquadra nos critérios de alta complexidade, e se o CPF do paciente bate com o CPF de algum beneficiários de plano de saúde ... somente nestas condições ... (*2)
· ... a ANS acrescenta “um plus” no valor pago pelo SUS ao serviço de saúde, e apresenta a conta para ser paga pela operadora de panos de saúde; (*3)
· Esta apresentação é apelidada pelo nome do instrumento de registro: ABI – Aviso de Beneficiário Identificado;
· Operadora de planos de saúde “tem o direito” de contestar a cobrança junto à ANS; (*4)
· Passado o rito de contestação, análise e eventual ajuste na apresentação da ABI, a ANS gera a GRU (Guia de Recolhimento da União), inscrevendo o valor nos débitos inscritos em dívida ativa na União;
· O montante arrecadado é disponibilizado ao FNS (Fundo Nacional da Saúde), que decide o que fazer com ele; (*5)
· Não concordando, ainda cabe para a operadora, como tudo, o recurso na justiça ... uma das coisas que compõem a “gordíssima” judicialização da área da saúde ! (*6)
Concordando ou não com o fato de obrigar a operadora a ressarcir o SUS ...
· ... o assunto é tão controverso que anos e anos depois, particularmente não tenho opinião formada, dada a quantidade de cenários que envolvem o atendimento de um beneficiário na rede pública ... concordo tanto com os argumentos dos que concordam como com os argumentos dos que discordam ... e além do mais, isso já passou por todas as instâncias do Poder Judiciário (até do STF) ...
· É indiscutível que a dinâmica ... o processo de ressarcimento e não a motivação ... tem “um zilhão” de vieses ...
· É uma regulação inadequada ... e que encarece os sistemas de financiamento da saúde;
· E injusta ... particularmente se a operadora de planos de saúde não estiver equipada (preparada) para lidar com ela !
Citando alguns ... apenas alguns ... dos vieses, já é possível entender os danos e os números que serão apresentados a seguir.
(*1), (*2) e (*5)
· São muitos os serviços de saúde que não identificam adequadamente o paciente ... o CPF associado no atendimento ... para dezenas de milhares deles, é pura “loteria”;
· Sem sistemas de informação adequados, não ter CPF ou trocar o CPF de um paciente por outro é muito comum ... só quem não conhece a rede de atendimento SUS que é formado por muitos hospitais públicos e por muitas Santas Casas e outros hospitais filantrópicos desequipados não entende a dificuldade de identificar;
· No caso de orçamento contratualizado, os serviços até têm a cultura de não cobrar tudo nas contas da alta complexidade ... já que na maioria dos casos “a mesada” vai chegar não pelo valor do serviço, mas pela meta de número de AIHs, independente do valor delas !
· E como o dinheiro no final vai para o FNS ... não volta para o serviço ... nada motiva o serviço a mudar este cenário ... quando não existe motivação financeira as “outras motivações naturalmente perecem” !!
(*2)
· Que regulação é esta que define este ressarcimento somente para a alta complexidade ?
· No SUS mais da metade do orçamento é de âmbito ambulatorial !
· Se o objetivo é coibir que as operadoras não se utilizem da rede do SUS ... esta jamais deveria ser uma definição do escopo do ressarcimento !!
(*3)
· A maioria das operadoras mal conhece as regras de cobrança das contas do SUS ...
· ... quanto mais avaliar se o próprio valor cobrado pelo serviço do SUS está certo !
· E, como os números a seguir demonstram ... tem muita, mas muita, mas muita coisa cobrada errada !!
· ... se a operadora está despreparada ... paga !!!
(*4)
· Uma regulação onde a ANS é uma espécie de Deus !
· Ela manda a cobrança e ela mesmo julga se está certa ou errada ... uma espécie de “chefe absoluto” dos poderes legislativo, executivo e judiciário na questão ressarcimentos;
· E as operadoras que querem “glosar” as ABIs, não têm acesso aos prontuários do pacientes ... têm que acreditar naquilo que é cobrado delas ... muito ao contrário do que fazem quando vão pagar uma conta hospitalar na saúde suplementar ... fala sério !
O resultado destas “lambanças” ...
Não temos os dados de 2021 fechados ainda:
· Existe um “delay” de processamento no sistema da ANS/SUS ... na dinâmica ...
· Mas é possível verificar que após um absurdo de mais de 800 mil ABIs em um ano (2013) ... com o “enxame” de contestações ... o “sistema” eliminou parte dos absurdos e o volume caiu quase pela metade em 2020;
· Mas ainda é muito elevado ... qualquer regulação que permita eventos adversos em volume de 500 mil, em uma amostra de beneficiários de 5 milhões (os que consomem alta complexidade na saúde suplementar ... e exagerando bem o número diga-se de passagem) ... ~10 % ... não é aceitável ...
· “Não dá né” ! ... o que a regulação quer ? ... acabar com o evento adverso ou arrecadar para o SUS ?
O próprio gráfico do valor médio das ABI’s depõe contra “o sistema”:
· A tabela de preços do SUS praticamente não é reajustada;
· ... os poucos ajustes na tabela (os poucos reajustes, as inclusões e as substituições de itens mais baratos por itens mais caros ...
· ... não justificariam um aumento no ticket médio das ABI’s de ~34 % entre 2019 e 2021 !
· Nem a pandemia justifica ... cirurgias eletivas de altíssimo custo foram “colocadas no com gelador” ... de cardiologia, neurologia, oncologia ... procedimentos mais caros do que o tratamento de pacientes COVID !
Mas o mais inadequado do “cenário ressarcimento” é o “papel de Tribunal” que a ANS apropriou:
· Os recursos passam “por um júri interno” ... tratados como um tribunal mesmo, como mostram os gráficos:
· Analisando ... Não Impugnado ... Indeferido ... Deferido ... Primeira Instância ... Segunda Instância ... literalmente um tribunal em “todas as letras” ...
· ... um órgão regulador equipado como se fosse um órgão do poder judiciário ...
· ... um pecado ... desalinhamento em relação às melhores práticas da administração pública;
· Neste cenário a “Judicialização Pós Recurso ANS” é inevitável !
Os gráficos que comparam volumes de ABIs considerando estas “etapas do processo jurídico dentro da ANS” não deixam dúvida em relação à inadequação da regulação:
· Mais de 30 % é contestada ...
· A diferença entre as deferidas e as indeferidas é muito pequena ... apesar da alternância da coluna azul (indeferida) com a coluna laranja (deferida) ano a ano ... a relação entre elas é próxima de 100 % ...
· Com todo o viés que a afirmação pode ter: na prática, metade de chance da apresentação estar errada quando “a gente olha” para as ABIs !
Por isso fico contente quando tenho chance de interagir com gestores da saúde pública e privada, da fonte pagadora, do serviço de saúde e do fornecedor de insumos:
· Se o gestor da operadora “ignora” como as contas do SUS são formadas ... não recursa ... não sabe recursar ...
· Se o gestor do serviço de saúde público ignora a importância da identificação do paciente ... não fatura tudo que faz na alta complexidade ... não contribui para “penalizar as operadoras” que se utilizam propositalmente do seu serviço para suprir sua falta de rede ...
· Se o fornecedor não entende porque não consegue vender seu produto na Saúde Suplementar, porque não enxerga que o produto está sendo consumido pelos beneficiários dos planos na rede do SUS ... não coloca seu produto adequadamente no devido mercado;
· Em todos os casos ... o gestor deve conhecer a dinâmica da interligação dos 3 sistemas de financiamento ... e o ressarcimento das operadoras ao SUS é um dos principais elementos desta integração !
Dizem que um lutador de boxe que tem o melhor “direto” do mundo para derrubar o adversário no primeiro assalto pode perder a luta por pontos se o adversário tiver “pernas boas e passar 10 assaltos disparando jabs contra ele” ... é necessário ter a base ... isso vale para o Judô, o Caratê, para o Futebol ... e para os negócios ... em qualquer situação em que a gente tenha adversário (e adversário é diferente de inimigo !) em um cenário onde as regras estão definidas e claras ... se não tiver base, não aproveita as regras ... é fato !
Nas consultorias e nestes cursos discutimos as bases para entender as forças dos envolvidos nos sistemas de financiamento da saúde pública e privada no Brasil ... os “diretos” e os “jabs” do SUS, ANS, Operadoras, Serviços de Saúde e Fornecedores ... por isso me sinto tão honrado em interagir com eles na Jornada !!
Destacando que “coisa boa ou coisa ruim”, se não for nada ilegal, imoral ou antiético, depende do cenário ... cada cenário propõe oportunidades para atuação profissional aos que procuram estudar de forma isenta o que acontece nos sistemas de financiamento da saúde:
· Como exemplo, o da empresa (o investidor da mantenedora da empresa) que solicitou estudo para direcionar investimentos nas especialidades em que atua: ortopedia, oftalmologia e cardiologia;
· “Uma das páginas” do estudo, naturalmente, foi mapear na região de seu interesse (a do gráfico da esquerda) onde ocorre com mais frequência ressarcimentos ao SUS destas especialidades;
· Este mapa que identifica os municípios em que os ressarcimentos ocorrem com maior frequência, foi na sequencia estratificado por procedimento e valor;
· Este desmembramento fornece uma das mais importantes visões da gestão dos negócios na saúde suplementar (regulada ou não): só existem sistemas de saúde privados porque o público “tem gaps” ... se o SUS não tivesse gap ninguém compraria plano de saúde, ou pagaria saúde com dinheiro do próprio bolso;
· E se existem pessoas dispostas a pagar por um plano de saúde, e ainda assim utilizam a rede pública (onde ocorre o ressarcimento) temos o melhor sinalizador possível para investimentos na área privada: “gente com dinheiro” pagando por um plano de saúde, e sem rede credenciada adequada da operadora ... não é fantástico para quem quer investir em serviços de saúde ???
É sempre bom lembrar a importância de fazer isso regionalmente:
· O gráfico da direita já dá uma boa ideia de como este mesmo indicador é tão diferente regionalmente, mesmo sem estratificar as especialidades;
· Quando estratificamos então ... a constatação de cenários completamente diferentes nas diversas regiões do Brasil “não falha”.
Mesmo com o viés de que a identificação do paciente pode falhar mais, quando mais distante dos grandes centros o serviço de saúde se localiza ...
· ... mesmo com um péssimo sistema de regulação ...
· ... o indicador é “feito uma bússola”: pode dar uma “balançadinha para lá ou para cá” quando a gente “pega na mão” para ver onde fica o norte e se orientar ...
· ... mas está sempre apontando para o norte !!!
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Sobre o autor Enio Jorge Salu
Histórico Acadêmico
· Formado em Tecnologia da Informação pela UNESP – Universidade do Estado de São Paulo
· Pós-graduação em Administração de Serviços de Saúde pela USP – Universidade de São Paulo
· Especializações em Administração Hospitalar, Epidemiologia Hospitalar e Economia e Custos em Saúde pela FGV – Fundação Getúlio Vargas
· Professor em Turmas de Pós-graduação na Faculdade Albert Einstein, Fundação Getúlio Vargas, FIA/USP, FUNDACE-FUNPEC/USP, Centro Universitário São Camilo, SENAC, CEEN/PUC-GO e Impacta
· Coordenador Adjunto do Curso de Pós-graduação em Administração Hospitalar da Fundação Unimed
Histórico Profissional
· CEO da Escepti Consultoria e Treinamento
· Pesquisador Associado e Membro do Comitê Assessor do GVSaúde – Centro de Estudos em Planejamento e Gestão de Saúde da EAESP da Fundação Getúlio Vargas
· Membro Efetivo da Federação Brasileira de Administradores Hospitalares
· CIO do Hospital Sírio Libanês, Diretor Comercial e de Saúde Suplementar do InCor/Fundação Zerbini, e Superintendente da Furukawa
· Diretor no Conselho de Administração da ASSESPRO-SP – Associação das Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação
· Membro do Comitê Assessor do CATI (Congresso Anual de Tecnologia da Informação) do Centro de Tecnologia de Informação Aplicada da Fundação Getúlio Vargas
· Associado NCMA – National Contract Management Association
· Associado SBIS – Sociedade Brasileira de Informática em Saúde
· Autor de 12 livros sendo 3 pela Editora Manole, Editora Atheneu / FGV e demais em edições próprias para download gratuito nas páginas dos modelos
· Gerente de mais de 200 projetos em operadoras de planos de saúde, hospitais, clínicas, centros de diagnósticos, secretarias de saúde e empresas fornecedoras de produtos e serviços para a área da saúde e outros segmentos de mercado