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Nuances dos leitos para Internação no SUS e na Saúde Suplementar
0317 – 12/02/2023
Ref.: Cursos Profissionalizantes em Gestão da Saúde, Geografia Econômica da Saúde no Brasil e Jornada da Gestão em Saúde no Brasil
Desospitalização é um termo mal interpretado por muitos gestores da saúde pública e privada
(*) todos os gráficos e ilustrações são partes integrantes do Estudo Geografia Econômica da Saúde no Brasil e do material didático do Programa Cursos Profissionalizantes em Gestão da Saúde, dos cursos da Jornada da Gestão em Saúde e da Escepti
Estes gráficos sensacionais já seriam suficientes para que as pessoas entendessem como é desafiadora ... e motivante ... a gestão dos leitos para internação na saúde pública e privada:
· O da esquerda demonstra a distribuição percentual do volume de leitos por tipo em 2022;
· O da direita estratifica o volume separando os da saúde suplementar (barras laranjas) dos do SUS (barras azuis).
São muito interessantes para entender a dinâmica:
· Os 3 maiores grupos são os não especializados (clínica geral e cirurgia geral), em que as especialidades médicas se revezam ocupando os mesmos leitos conforme as demandas, e o grupo UTI que é “o símbolo” da especialização extrema de um tipo de leito ... temos então um paradoxo “logo de cara”;
· Os demais tipos de leitos existem em função das demandas / oportunidades específicas ... demanda no caso do SUS, e oportunidade de negócios no caso da saúde suplementar.
Nas primeiras aulas de disciplinas de gestão é “de praxe” discutir a lógica da gestão em saúde que aplicamos na prática em consultorias:
· Saúde suplementar só existe porque o SUS não cumpre seu papel constitucional de prover saúde com qualidade de forma ampla e irrestrita para toda a população;
· Apesar do SUS ser o melhor sistema público de saúde que existe no mundo ... um orgulho para nós ... têm deficiências;
· E não poderia ser diferente porque não existe recurso financeiro disponível para entregar para a população um produto sem limite de consumo com altíssima qualidade ... produto nenhum, em qualquer lugar do mundo pode ser entregue desta forma irrestrita com limitações de recursos financeiros ...
· ... a base para entender economia ... “qualquer economia” e não somente a Geografia Econômica da Saúde ... é nunca esquecer que os recursos são escassos em qualquer situação.
Então, nestas deficiências do SUS ... nestes flancos ... nos seus gaps ... a saúde suplementar se desenvolve:
· E se desenvolve de forma diferente porque o SUS não é “igualmente deficiente” em qualquer lugar;
· E porque ao invés de prover um produto que o consumidor não paga diretamente (SUS), a saúde suplementar explora a capacidade do cliente que pode pagar;
· E a capacidade de pagar também “depende regionalmente” ... logo ... são, e sempre serão, produtos completamente diferentes, tanto o SUS como a saúde suplementar, regionalmente.
E os gráficos são sensacionais porque:
· O da esquerda demonstra que leitos especializados se viabilizam em condições específicas ... onde a demanda do SUS ou da SS exige que existam para reduzir os custos;
· Na lógica da gestão de custos, é mais barato tratar pacientes em infraestruturas especializadas do que em infraestruturas gerais (ou genéricas), mas quando existe volume que ocupe o leito ...
· ... então existem os diversos tipos, mas de menor volume do que os não especializados, porque nem sempre temos o volume necessário para girar os pacientes sem deixar “a cama desocupada”;
· E o da direita demonstra que, como característica básica, onde o SUS evolui incrementando leitos, a saúde suplementar se retrai ... e vice-versa ... porque onde o SUS é mais eficiente, menor a oportunidade de negócios na saúde suplementar ! ... comprovando a tese !!
Imagine você se uma pandemia fizesse parar o crescimento do cabelo:
· A quantidade de cadeiras para cabelereiros, barbeiros e afins diminuiria muito não é verdade ?
· Mas se não parasse de crescer o cabelo nas pessoas loiras ... se os cabelos loiros passassem a crescer mais do que o normal, e os demais tipos de cabelo parassem de crescer ?
· A quantidade diminuiria assim mesmo, mas o impacto nas cadeiras de cabelereiros e barbeiros seria menor porque existem muito menos pessoas loiras do que as que têm outros tipos de cabelo.
A pandemia fez com os leitos algo parecido com a segunda condição ... a dos cabelos loiros:
· Necessitamos aumentar a quantidade de leitos para tratar pacientes COVID, porque não tínhamos tantos leitos de UTI, e leitos “não UTI” adequadamente equipados para doenças respiratórias;
· Mas reduzimos drasticamente a necessidade dos leitos para tratar outras doenças ... mesmo cardio, onco ... doenças que têm como característica o aspecto da urgência do tratamento ...
· ... e no geral, qualquer coisa eletiva ... que poderia esperar um pouquinho ... foi adiada ... reduzindo drasticamente a necessidade geral de leitos para internação !
Mas o gráfico demonstra que, no geral, tanto no SUS como na Saúde Suplementar a evolução do volume de leitos entre o antes e o após a pandemia (3 anos) foi “gigante”:
· Em um cenário de “não necessidade de incrementar leitos” ... a quantidade se elevou “na casa” dos 10 % ...
· ... demonstrando que a demanda pelo acesso à saúde é muito mais complexa do que os “simplistas” definem em “meia dúzia de jargões”;
· Quanto mais tempo a gente atua e estuda o mercado da saúde pública e privada, mais vai tendo mais certeza de que não existe solução simples para problemas complexos de acesso da população à saúde !
A evolução da quantidade de leitos, em uma época em que “o bicho” fez de tudo para fechar o máximo de leitos possível para tratamentos eletivos foi s e n s a c i o n a l , verdadeira resiliência do segmento da saúde ao cenário econômico tenebroso que se desenhou !!!
É claro que a evolução foi muito diferente regionalmente:
· Os repasses do governo federal ao SUS são proporcionais à população existente ... mas os complementos dos Estados, Distrito Federal e Municípios são proporcionais à sua arrecadação de tributos ... só isso já seria suficiente para explicar a diferença regional ...
· ... mas o olhar do governante para a saúde, independente disso, também faz a diferença;
· Tem político que acha que a “saúde é um saco” ... não dá voto ... é uma despesa no orçamento que não se pode eliminar ... outros (minoria absoluta) entendem saúde como investimento ... como fator de desenvolvimento econômico ... “cada um cada um” ... não tem jeito !
O interessante nestes gráficos de evolução de calor (os do lado direito), é que as maiores evoluções não estão nas regiões Sul e Sudeste:
· As regiões Sul e Sudeste continuam sendo as “campeãs de audiência escancaradas” em volume de leitos;
· Mas a evolução proporcional tem se verificado “da linha que cruza por MG e MS” para cima ...
· ... uma tendência de mudança de perfil na oferta de leitos que vai se fortalecendo “ano a ano”, tanto no SUS como na saúde suplementar !
· O “negócio” continua sendo muito promissor nas regiões Sul e Sudeste ... muito bom mesmo ... mas o “Eldorado está mudando de lugar” !! ... os números mostram, para quem quiser ver é claro !!!
As concentrações de leitos, como demonstram os mapas, continuam muito significativas em regiões metropolitanas ... com altíssima concentração populacional, tanto no SUS, como na Saúde Suplementar:
· O turismo da saúde que esta concentração gera continua fortíssimo;
· Nem o SUS vai financiar um equipamento público em uma cidade com leitos se a ocupação for baixa ...
· ... nem o investidor da saúde suplementar vai investir em uma unidade de internação em uma cidade que não tem beneficiários de planos e particulares suficientes para garantir a ocupação mínima necessária para “colocar as contas” pelo menos no ponto de equilíbrio do resultado financeiro;
· Então o SUS, através de uma regulação muito eficiente apesar de criticada, leva para lá e para cá pacientes de pequenas e médias cidades para realizar procedimentos de maior complexidade em especialidades nas grandes cidades ...
· ... e as operadoras credenciam serviços de saúde, ou criam seus serviços próprios, nas grandes cidades !
E vale lembrar que, como temos uma medicina de excelência quando comparada a maioria absoluta dos países de todo o mundo ... amplamente reconhecida inclusive pela nossa produção científica ...
· Completam o cenário deste turismo da saúde os pacientes que vêm de outros países para se tratarem aqui ... e não são poucos nossos hospitais que entregam produtos de maior valor agregado !
· Estes “turistas da saúde” são melhor acolhidos em cidades que têm uma infraestrutura hoteleira e de logística (aeroportos, estradas ...) mais robustas !!
Quem está antenado ... faz uma gestão pública de maior qualidade ... aproveita melhor as oportunidades na saúde suplementar ... e o perfil dos leitos reflete este “antenamento da gestão” !
Os números nunca mentem:
· Veja como são diferentes aqueles gráficos de calor anteriores quando, ao invés de grafarmos o volume de leitos, grafamos o número de leitos per capita, ou seja, o número de leitos dividido pela população;
· O da esquerda demonstra o número de leitos SUS pela população dependente SUS (a parcela da população que não tem plano de saúde);
· O da direita o número total de leitos (SUS e SS) pela população total;
· Neles o protagonismo das grandes metrópoles até persiste ... mas não de forma tão preponderante como nos gráficos de volume absoluto de leitos.
Como o Brasil é um país de dimensões continentais muitas cidades de médio porte que vão entendendo saúde como oportunidade de desenvolvimento econômico “vão abocanhando a fruta” e investindo em leitos para internação:
· No caso do SUS o gestor trabalha “articulando politicamente” para que equipamentos públicos sejam construídos na sua cidade e não na vizinha – política é isso: saber articular !
· E no caso da saúde suplementar desenhando um sólido modelo de negócios que calcula o custo x benefício de ter o leito na cidade, ou “alugar” o que existe da cidade vizinha !!”
· Antenado ... e com esta visão ... o gráfico na sua região vai ficando mais vermelhinho !!!
· Casos como Barretos de São Paulo, que não é uma região metropolitana e todos reconhecem sua participação no protagonismo da saúde, se esparramam por várias regiões do Brasil ... dá gosto de ver !! ... pontuais ... não são a regra ... ainda exceção ... mas dá gosto de ver !!!!
Não poderia deixar de fazer ... seria pecado se não ilustrasse ... como as especialidades “costuram” o desenvolvimento dos leitos que necessitam:
· Os gráficos demonstram a evolução e distribuição per capita de leitos especializados em Cardiologia, Psiquiatria / TM e Oncologia, antes e após a pandemia;
· Todos tratam de doentes ... mas como as doenças são muito diferentes ... como a frequência e a característica das doenças variam regionalmente ...
· ... a eficiência do SUS varia ... consequentemente as oportunidades de negócios para a saúde suplementar variam ... e consequentemente os desenhos dos cenários variam ... e variam muito !
Os três mostram que quando o SUS retrai, a SS expande ... é assim ... quanto mais o SUS retrai, mais a SS expande !
E não poderia deixar de encerrar a explanação comentando que existe muita gente que conceitua desospitalização de forma completamente equivocada:
· Desospitalização é não internar se não for necessário ... se o tratamento puder ser feito de forma diferente;
· Desospitalização é não deixar o paciente mais tempo internado do que o necessário ... quanto mais tempo ele estiver em ambiente hospitalar maior o risco, e pior a sua qualidade de vida;
· Desospitalização não é um movimento de fechar leitos ... tem gente que acredita que as internações não serão mais necessárias no futuro ! ... que o homem não pisou na Lua ... que ... que ...
O crescimento da população, o envelhecimento da população, o diagnóstico tardio que leva o paciente para tratamentos mais complexos do que se o diagnóstico tivesse sido precoce, a descoberta de tratamentos para doenças que não tinham tratamento ... tudo isso aumenta a necessidade de leitos.
Uma coisa é:
· Entender que existem tratamentos quimioterápicos cada vez mais eficientes que reduzem a necessidade de internação para cirurgias e tratamentos clínicos oncológicos ... que colaboram para a desospitalização;
· Entender que o tratamento de transtornos mentais evoluiu e não necessitamos mais de hospitais psiquiátricos que abrigavam 10 mil ... 12 mil pacientes em condições sub-humanas ... que colaboram para a desospitalização.
Outra coisa é:
· Arbitrariamente desrespeitar a indicação do médico sobre o tempo necessário de permanência do paciente internado ... paciente que ele está acompanhando e não quem está pagando a conta ... e usar a narrativa da tendência de desospitalização para glosar diárias em contas;
· “Pregar” que uma “pajelança” pode substituir uma cirurgia ou um tratamento clínico especializado em internação, que é baseada em evidências e protocolos que demoraram décadas para serem desenvolvidos e aceitos cientificamente ...
É necessário diferenciar a essência do movimento de desospitalização ... de verdadeiros “crimes contra a saúde” praticados por pessoas que têm interesse financeiro em não pagar pelas internações necessárias, ou ficam dando opinião sobre coisas que necessitam embasamento científico para serem discutidas ... que ficam tratando subjetivamente coisas que só podem ser entendidas de forma objetiva ! ... pessoas irresponsáveis que deveriam se manter em redes sociais de fofoca ao invés de habitar o ambiente de gestão da saúde que envolve fontes pagadoras, serviços de saúde e fornecedores de insumos que atuam de forma profissional e ética !!
Agindo de forma legal, moral e ética, o gestor que está inserido em cada cenário específico trabalha melhor a oferta de leitos:
· E o mais recompensante para o gestor nem é o resultado financeiro que ele dá para o SUS, para a operadora, para o hospital ... isso é muito importante sim ... não existe dúvida quanto a isso;
· ... mas o mais importante é que havendo a oferta mais adequada à demanda ... existindo o máximo possível de leitos para a procura ... havendo dimensionamento que dê sustentabilidade financeira tanto para a fonte pagadora como para o serviço de saúde ... para o médico ... para o fornecedor ...
· ... quanto melhor estiver equacionada a quantidade de leitos e o equilíbrio financeiro ... maior e melhor será o acesso da população à saúde ... isso é o que mais deve importar para o gestor da saúde sempre !
Gestão da saúde pública ou privada é prover acesso sustentável economicamente ... porque dinheiro de sobra não existe ... nem no SUS nem na saúde suplementar ... não dá para deixar o futuro “ao Deus dará” ... é necessário estar vigilante !!
Referências sobre conteúdo para gestores da área da saúde privada e pública:
· Programa CPGS – Cursos Profissionalizantes em Gestão da Saúde www.cpgs.net.br
· Cursos da Jornada da Gestão em Saúde www.jgs.net.br
· Geografia Econômica da Saúde no Brasil, e seminários temáticos www.gesb.net.br
· Lista de milhares de profissionais certificados www.escepti.com.br/certificados
· Informações adicionais sobre cursos e consultoria em gestão na área da saúde contato@escepti.com.br
Sobre o autor Enio Jorge Salu
Histórico Acadêmico
· Formado em Tecnologia da Informação pela UNESP – Universidade do Estado de São Paulo
· Pós-graduação em Administração de Serviços de Saúde pela USP – Universidade de São Paulo
· Especializações em Administração Hospitalar, Epidemiologia Hospitalar e Economia e Custos em Saúde pela FGV – Fundação Getúlio Vargas
· Professor em Turmas de Pós-graduação na Faculdade Albert Einstein, Fundação Getúlio Vargas, FIA/USP, FUNDACE-FUNPEC/USP, Centro Universitário São Camilo, SENAC, CEEN/PUC-GO e Impacta
· Coordenador Adjunto do Curso de Pós-graduação em Administração Hospitalar da Fundação Unimed
Histórico Profissional
· CEO da Escepti Consultoria e Treinamento
· Pesquisador Associado e Membro do Comitê Assessor do GVSaúde – Centro de Estudos em Planejamento e Gestão de Saúde da EAESP da Fundação Getúlio Vargas
· Membro Efetivo da Federação Brasileira de Administradores Hospitalares
· CIO do Hospital Sírio Libanês, Diretor Comercial e de Saúde Suplementar do InCor/Fundação Zerbini, e Superintendente da Furukawa
· Diretor no Conselho de Administração da ASSESPRO-SP – Associação das Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação
· Membro do Comitê Assessor do CATI (Congresso Anual de Tecnologia da Informação) do Centro de Tecnologia de Informação Aplicada da Fundação Getúlio Vargas
· Associado NCMA – National Contract Management Association
· Associado SBIS – Sociedade Brasileira de Informática em Saúde
· Autor de 12 livros pela Editora Manole, Editora Atheneu / FGV e Edições Própria
· Gerente de mais de 200 projetos em operadoras de planos de saúde, hospitais, clínicas, centros de diagnósticos, secretarias de saúde e empresas fornecedoras de produtos e serviços para a área da saúde e outros segmentos de mercado