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Utilizando médias para piorar a saúde, a educação, o transporte ...
0370 – 29/11/2023
Ref.: Cursos Profissionalizantes em Gestão da Saúde, Geografia Econômica da Saúde no Brasil e Jornada da Gestão em Saúde no Brasil
A “mania” da previsão do tempo aplicada na gestão dos serviços públicos
(*) todos os gráficos e ilustrações são partes integrantes do Estudo Geografia Econômica da Saúde no Brasil e do material didático do Programa Cursos Profissionalizantes em Gestão da Saúde, dos cursos da Jornada da Gestão em Saúde e da Escepti
Na semana passada realizamos a oficina “Panorama de Saúde Suplementar, Fraudes, Riscos e Sustentabilidade” em uma turma de pós-graduação da Faculdade Einstein ... sempre orgulhoso pelo convite feito pelas Profas. Glauce Roseane de Almeida Brito, Marcela Marrach Coutinho, e Deise Carvalho ... muito obrigado !
· “Pegamos” uma cidade, pincelamos os principais atores da saúde privada e pública que permeiam a gestão da saúde nela, e fomos discutindo, com base em um caso real, as nuances do financiamento da saúde pública e privada, sem vieses de interesses de entidades de classe, de política, de que lado da mesa de negociação podemos estar;
· Em um ambiente como este em que não existe pressão para se posicionar de uma forma ou de outra, as discussões são extremamente motivadoras;
· Sempre comento que, se posso contribuir com alguma coisa na capacitação ou atualização de gestores na área da saúde, é insistir para que as decisões sejam baseadas na interpretação correta dos indicadores ... dos números ... nunca em achismos, ou na opinião de fulano ou ciclano ... decisão objetiva sempre é a chave do sucesso do gestor da saúde, e consequentemente de quem necessita do acesso aos recursos de saúde.
O achismo, a opinião, a propaganda ... só interessam para quem defende “a sua própria pele”:
· É claro que quando estamos dentro de uma cadeia de valores temos que “jogar o jogo” e achar, e opinar ... mas só vamos ter sucesso se entendermos objetivamente a situação ... até para “enfeitar o pavão” da forma que mais seja conveniente para o papel que estamos representando ... até para saber se estamos realmente “valorizando ou desvalorizando” ... para estarmos preparados para lidar com a “lei da ação e reação”;
· Por isso, interpretar adequadamente os números é importante ... da forma correta, dentro do contexto correto, “aí é” fundamental ... muito mais que importante !
Usando a figura para iniciar a diferença entre ter números e fazer uso adequado deles:
· O gráfico da esquerda ilustra a evolução de um indicador de casos de racismo, e de agressão contra mulheres;
· O gráfico superior da direita ilustra como uma prefeitura controla a disponibilidade de ônibus para a população, em relação à média de passageiros;
· O gráfico inferior da direita ilustra como um órgão gestor de saúde controla a disponibilidade de leitos em relação à população.
Da forma como são apresentados sugerem interpretações completamente diferentes do que realmente os dados demonstram. E quem assim divulga, de acordo com o seu interesse ... utilizando “o número” para embasar sua proposição ... expõe números certos, mas em contextos errados.
Repaginando a leitura o primeiro gráfico:
· Sem “mexer” nos números ou na forma de apresentação dos gráficos ...
· ... apenas detalhando da forma adequada a legenda do gráfico ...
· ... reduzimos a margem de erro de interpretação do contexto.
Os dados foram colhidos a partir do registro de denúncias:
· Portanto, ilustram a evolução das denúncias ... não demonstram a evolução dos casos de agressão contra a mulher, nem a evolução dos casos de racismo;
· Todos os casos que não foram denunciados, que não sabemos quantos são, estão fora do contexto !
· Não é possível avaliar, com estes números, se as agressões contra a mulher ... se o racismo ... está evoluindo ou não ... é possível apenas avaliar a evolução dos registros dos casos ... não dos casos !!
Pessoas da minha idade sabem que, graças a Deus, o racismo e as agressões contra a mulher na verdade estão reduzindo:
· No passado era “muito mais comum” ... era rotina ... casos de racismo “no cotidiano” ... era algo normal ... era comum ouvirmos piadas racistas ... até mesmo em espetáculos públicos ... declamadas por “comediantes” famosos;
· O que o Vinícius Junior sofre, e isso é inaceitável, era “coro” de torcida mais do que frequente nos estádios, ginásios, nas “peladas da várzea”, nas escolas ...
· Com o passar do tempo ... com a conscientização de uma maior parcela da população a respeito do racismo .... com as leis que punem o racismo ... os casos de racismo reduziram ... isso é fato;
· Com o passar do tempo ... com o maior acesso dos prejudicados pelos atos racistas à denúncia ... com o maior aparato para acolher e coibir o racismo ... o volume de registros de casos aumentou;
· Hoje, se alguém ouvir uma piada racista o “comediante” é imediatamente repelido ... e com maior probabilidade que antes: denunciado ! ... como está acontecendo em relação ao caso do “Vini Jr” !
Se concordar que na realidade os casos de racismo reduziram, e o que está aumentando é o volume de registros, o aumento no registro de casos é um indicador que estamos desenvolvendo uma estrutura cada vez melhor para que o prejudicado possa exigir seus direitos.
O mesmo ocorre no caso dos registros de agressão contra a mulher:
· Era mais do que rotina vivenciarmos agressões contra mulheres ... era algo absolutamente normal;
· Era tão normal que existiam ditados como o ”em briga de marido e mulher não se deve meter a colher” ... “ele pode não saber porque está batendo mas ela sabe porque está apanhando” ...
· ... inúmeros programas de humor tinham mulheres sendo agredidas de todos os tipos de forma: física, moral, social ...
· Assédio em transporte público ... em aglomerações de qualquer tipo ... era absolutamente normal ... era assunto em “clubes do bolinha” contados como se fossem dignos de troféus;
· Homens matavam mulheres e não eram nem condenados “em nome” da “legítima defesa da honra” ! ... quantos nem mesmo denunciados foram nos “quatro cantos do país” ?
É fato que o volume de agressões reduziu:
· Mas é fato que o volume de registros aumenta !
· Aumenta porque mais mulheres estão se encorajando a denunciar;
· E também, justamente, porque temos estruturas de denúncia e proteção para quem denuncia melhores do que eram antes;
· Quanto mais estas estruturas evoluem, mais acesso as prejudicadas têm para registrar as agressões ... para pedir proteção ... para acreditar que a realidade para elas mudou;
· Bem ou mal ... com a velocidade necessária, ou de forma mais lenta do que poderia ser ... nossa sociedade está evoluindo ... se olharmos os primeiros gráficos sem analisar realmente o que significam os dados ... sem a legenda ... somos induzidos a interpretar de forma contrária !!
É comum no Brasil utilizar o termo “foi maior que a média” em situações que não tem o menor cabimento de serem utilizados:
· Nós somos “achocalhados” com notícias alarmantes de índice de chuva acima da média quase diariamente;
· Chega a ser “cômico” ver um jornalista dizendo “ontem choveu em um dia mais que a média de 1 mês !
· Se é uma média de chuva de diversos dias, é claro que a chuva em um dia pode ser maior que a média e isso não significar absolutamente nada !
· A média do mês que ele se refere pode ter sido de uma ou duas chuvas por mês ... mas da forma como eles falam parece que todo dia chove, o que não é verdade nem nas cidades de maior índice pluviométrico do mundo ... utilizar este “jargão” é quase 100 % das vezes absolutamente sensacionalista !!
É um festival de afirmações desconexas ... “show de horror” ...
· Ontem choveu 120 milímetros enquanto anteontem choveu 100 milímetros ...
· ... o que se conclui sobre isso em relação a enchentes em determinados locais da cidade ?
· Até interessaria saber se a informação fosse que ontem choveu 120 milímetros em 30 minutos na Lapa enquanto anteontem choveu 100 milímetros em 10 horas em toda a cidade !
· Assim teríamos algum discernimento para saber que caiu muito mais água em um período muito curto de tempo, dificultando o escoamento da água ... mas sem este parâmetros de tempo e espaço: “me poupe” !
Previsão do tempo em telejornais já há anos é uma informação “bem inútil” ... temos em tempo real no nosso celular, muito mais detalhada para os locais onde vivemos ... para onde vamos ...
· Estar em Sampa e ouvir que vai chover em Xapuri, no Acre, não é o que podemos considerar algo útil, a não ser para uma insignificante parcela da população de Sampa que eventualmente tem uma viagem programada para lá;
· E ainda escutamos todos os dias explicações “do Mundo de Beakman” que não servem para nada na nossa vida real ... porque está calor ... porque está frio ... porque está chovendo ... apenas para ocupar o tempo dos noticiários quando não têm notícia suficiente para dar e ocupar o tempo todo do programa, não é verdade ?
· Se tem notícia que interessa, a previsão é curta e grossa ... se não tem notícia, vão explicar que um ¨*$&%¨%*& se formou ao sul de ))(&*&%(¨% e com isso uma )*¨)&%((&%) pode fazer chover em pontos isolados ... ou seja, se chover onde voce está, voce está em um ponto isolado ... se não chover onde voce está, voce não está em um ponto isolado ... entendeu ?
O dano desta prática de utilizar números “para encher linguiça” pode ser pequeno quando falamos em previsão do tempo ...
... mas quando um prefeito de uma cidade responde a crítica da população sobre a demora no intervalo de ônibus dizendo que o número de viagens é controlado pela média de passageiros ... isso é revoltante !
O gráfico da esquerda demonstra que o número de passageiros por ônibus “habita” as cercanias da média histórica:
· E com isso o prefeito justifica que o número de ônibus circulando está adequado ... dentro da média;
· Ele “não pega ônibus” !
· Se “pegasse”, sentiria o que demonstra o gráfico da direita que trabalha os mesmos dados mas apresentando o número médio de passageiros por ônibus;
· Esse demonstra que, por causa do seu equivocado método de controle de demanda de ônibus, temos cada vez menos ônibus circulando ... mais ônibus parados, justificados pelo “número mágico da média” !!
· Menos ônibus circulando, maior o intervalo de tempo entre um e outro ... maior o tempo de viagem para o passageiro ...
· ... para ele que “pega o carro com chofer” a hora que quer sem ter que esperar “de pé” no ponto, e correndo maior risco de ser assaltado está tudo bem ... mas para quem depende do ônibus: pranto e ranger de dentes !!!
Utilizando a média de forma inadequada para iludir a população e defender seus interesses “orçamentários” ... o serviço entregue para a população naturalmente piora gradativamente ! ... e isso é fato !!
O mesmo ocorre na área da saúde:
· Quando se equipa os serviços públicos com base em médias históricas ...
· ... média de leitos por pacientes ... média de médicos por pacientes ... média de enfermeiros por leito ...
Entendendo:
· Se o serviço de saúde público fosse perfeito, utilizaríamos a média para “copiar” o que está dando certo ...
· ... reduzindo a chance de errar no dimensionamento !
· Para expandir o sistema de saúde, por exemplo, poderíamos utilizar médias como parâmetro “mínimo” ... agindo prudentemente para não projetar algo pior do que existe;
· Mas como o serviço de saúde público está longe de ser perfeito ... se sabemos que está aquém da necessidade ... se utilizamos médias, é claro que “NA MÉDIA” vai piorar cada vez mais ! ...
· ... não é necessário ser nenhum “gênio” para entender isso não é verdade ?
Se analisamos o número de leitos disponíveis em relação à média de leitos existentes “nos livros”:
· Podemos produzir um gráfico como o da esquerda que dá a impressão de que “está tudo bem” ... as variações estão “dentro da média”;
· Mas se analisamos a evolução do número de leitos disponíveis “per capita” como no gráfico da direita, vemos que o serviço entregue para a população está cada vez pior !
E as filas para internação naturalmente crescem ... isso é fato !
Tive a oportunidade de discutir, nesta oficina da Pós-graduação do Einstein, com um grupo que não tem interesse pessoal ou profissional algum ... os alunos ... as nuances do SUS, da Saúde Suplementar Regulada, e da Saúde Suplementar Não Regulada, em um caso real ... dados da cidade de Caraguatatuba:
· Ninguém que estava na sala reside ou trabalha nela;
· Uma cidade de ~100 mil habitantes ... que representa uma parcela importante das cidades onde o tema gestão da saúde faz todo o sentido;
· E discutimos desde quem são os protagonistas da saúde pública e privada, até como auditores de contas devem priorizar sua atividades nos diversos atores que lá existem, passando sobre como as contratualizações entre fontes pagadoras e serviços de saúde podem se viabilizar ou não no contexto.
O mais legal de ter pego uma cidade como esta, é que o contexto muda completamente em determinadas épocas do ano ... a cidade praticamente quintuplica de habitantes em feriadões e temporadas ... o contexto da rotina fora destes períodos é completamente diferente !
Fiquei muito contente com as interações deles a cada tema colocado para discussão ... porque eles “deixaram os paradigmas” de lado e analisaram os contextos ... foi muito gratificante para mim ... acho que poucas pessoas conseguem entender o quanto isso é gratificante ... saber que estes alunos, atuando como gestores, vão se preocupar com os contextos nas decisões que tomam / vão tomar na vida prática ... na vida real !! ... gestor bem-preparado é o que viabiliza o maior acesso dos beneficiários do SUS e da Saúde Suplementar aos recursos da saúde !!!
A última aula do ano para mim em 2023 em turmas de pós-graduação nas instituições que tenho a honra de contribuir não poderia ter sido ser mais motivante do que uma oficina como esta !!!!
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Sobre o autor Enio Jorge Salu
CEO da Escepti Consultoria e Treinamento
Histórico Acadêmico
· Formado em Tecnologia da Informação pela UNESP – Universidade do Estado de São Paulo
· Pós-graduação em Administração de Serviços de Saúde pela USP – Universidade de São Paulo
· Especializações em Administração Hospitalar, Epidemiologia Hospitalar e Economia e Custos em Saúde pela FGV – Fundação Getúlio Vargas
· Professor em Turmas de Pós-graduação na Faculdade Albert Einstein, Fundação Getúlio Vargas, FIA/USP, FUNDACE-FUNPEC/USP, Centro Universitário São Camilo, SENAC, CEEN/PUC-GO e Impacta
· Coordenador Adjunto do Curso de Pós-graduação em Administração Hospitalar da Fundação Unimed
Histórico Profissional
· Pesquisador Associado e Membro do Comitê Assessor do GVSaúde – Centro de Estudos em Planejamento e Gestão de Saúde da EAESP da Fundação Getúlio Vargas
· Membro Efetivo da Federação Brasileira de Administradores Hospitalares
· CIO do Hospital Sírio Libanês, Diretor Comercial e de Saúde Suplementar do InCor/Fundação Zerbini, e Superintendente da Furukawa
· Diretor no Conselho de Administração da ASSESPRO-SP – Associação das Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação
· Membro do Comitê Assessor do CATI (Congresso Anual de Tecnologia da Informação) do Centro de Tecnologia de Informação Aplicada da Fundação Getúlio Vargas
· Associado NCMA – National Contract Management Association
· Associado SBIS – Sociedade Brasileira de Informática em Saúde
· Autor de 12 livros pela Editora Manole, Editora Atheneu / FGV e Edições Próprias
· Gerente de mais de 200 projetos em operadoras de planos de saúde, hospitais, clínicas, centros de diagnósticos, secretarias de saúde e empresas fornecedoras de produtos e serviços para a área da saúde e outros segmentos de mercado