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The Day After da Tabela SUS Paulista
0388 – 03/06/2024
Ref.: Cursos Profissionalizantes em Gestão da Saúde, Geografia Econômica da Saúde no Brasil e Jornada da Gestão em Saúde no Brasil
Algumas instituições ganham, outras perdem ... se não mudar a forma, a população é a que mais vai perder com a mudança
(*) todos os gráficos e ilustrações são partes integrantes do Estudo Geografia Econômica da Saúde no Brasil e do material didático do Programa Cursos Profissionalizantes em Gestão da Saúde, dos cursos da Jornada da Gestão em Saúde e da Escepti
O post de janeiro de 2024 sobre o tema versava que o complemento dado pelo Governo de São Paulo para atendimentos do SUS eclodiria discussão: o assunto está na pauta de 120 % das instituições que prestam serviço para o SUS no Estado.
Como dito: não importa ser de extrema esquerda, esquerda, direita, extrema direita ... a iniciativa é elogiável, mas o tempo vai nos dizer se é uma ação eleitoreira ou se é uma ação social.
A figura é emblemática:
· Uma reunião do conselho do HC da Unicamp para discutir perda de receita em função da nova tabela;
· Uma reportagem indicando que a Santa Casa de São Paulo está demitindo médicos em função da nova tabela;
· É emblemática por se tratar de uma empresa pública (o HC da Unicamp) e de uma empresa privada (a Santa Casa de São Paulo), demonstrando que tanto faz se a instituição tem vínculo direto com o governo ou não: tem que se adaptar ao que foi definido como Tabela SUS Paulista para manter a sua sustentabilidade.
É bastante comum na gestão do SUS, especialmente naquilo que não é definido no âmbito federal, que as propostas não tenham “visão matricial” dos efeitos:
· A gestão da saúde é matricial no sentido de que o financiamento tem uma estrutura de gestão independente da gestão assistencial ... são gestões que devem “se conversar” para terem sucesso;
· É fácil entender isso para que “milita no ramo” há décadas;
· Estou em um projeto que visa melhorar o financiamento de uma Secretaria de Estado da Saúde e, mais uma vez, a maior dificuldade não é definir o que é necessário fazer para melhorar a sustentabilidade financeira ... as ações de melhoria da gestão são sempre muito claras ... o que deve ser feito no âmbito da administração são ações objetivas ... a dificuldade é sempre fazer com que gestão financeira e gestão assistencial estejam “na mesma página” !
· Quando a gente consegue promover o alinhamento entre financiamento e assistência, fazendo com que as duas linhas de gestão “se auto colaborem” ... colaborem de verdade – não aquela colaboração de discurso que na prática acaba virando um “jogo de empurra-empurra” ... quando isso acontece o resultado é sempre bom ... e no caso do SUS, quem sente o resultado é a população.
Estes dois casos ilustram o que está acontecendo na maioria absoluta dos casos ... não em todos ... mas na maioria dos casos o projeto Tabela SUS Paulista está sendo um empurra da SES-SP para os serviços de saúde:
· Pode ser ... todos torcem que assim seja ... que a SES-SP esteja empurrando, mas em alguns meses vai abrir as portas para os serviços de saúde para discutir a redefinição de alguns parâmetros;
· Pode ser ... torcemos para que assim não tenha sido ... que a SES-SP tenha feito uma mera ação eleitoreira ... que não vai abrir as portas para ajustar o modelo, e a população vai perder muito ... como está perdendo neste momento.
É preciso entender que não adianta reajustar somente parte dos preços da tabela para que o SUS melhore no Estado:
· O projeto só tem chance de dar certo se algumas coisas, que não são o reajuste de parte dos itens da Tabela SIGTAP, estejam na pauta do Governo ... será que estão ?
· Vale a pena discorrer sobre o que está na cabeça de todo gestor que conhece um pouco do financiamento do SUS para acompanhar os próximos passos ... “o dia depois do dia seguinte” ... porque “The Day After” está mais para o filme do que para o que boa parte dos gestores imaginaram que seria ! ... The Day After é o que demonstra a figura !!
Para quem não teve a oportunidade de conhecer o projeto Tabela SUS Paulista, vale esclarecer alguns pontos para melhor entendimento do que está acontecendo no HU da Unicamp e na Santa Casa de São Paulo:
· O Governo do Estado não “reajustou” a tabela inteira ... ele aumentou o complemento que fazia em parte dela;
· Todos os Estados, mesmo os mais “pobres”, sempre complementam o repasse federal do SUS de uma forma ou de outra;
· A Tabela SUS Paulista é o aumento no repasse de parte dos procedimentos da Tabela SIGTAP;
· Como ilustra o gráfico, a quantidade de itens da Tabela SIGTAP que o Governo do Estado aumentou o complemento gira em torno de apenas 35 % do total de itens.
A iniciativa não teria a menor contraindicação se estivesse sendo elevado o complemento desses itens e mantido o repasse dos demais ... mas não é isso que está acontecendo ... não é o que está acontecendo “até agora” !
Vamos lembrar uma outra característica do financiamento SUS:
· O repasse aos serviços de saúde pode ocorrer de 2 formas: contratualizado por metas, ou contra apresentação de contas;
· Na contratualização por metas o repasse é praticamente fixo, dependendo de algumas metas de produção estabelecidas para o serviço de saúde;
· Na contra apresentação de contas, conforme o serviço de saúde vai produzindo, vai recebendo proporcionalmente ao que entrega ao SUS;
· E, mesmo na contratualização, é comum uma parte da produção ser remunerada contra apresentação.
Não vale a pena aqui discutir detalhes:
· Quando a gente se envolve em projetos de melhoria do faturamento de hospitais, o principal é permear detalhes deste conceito tanto pelos administradores como para os profissionais assistenciais;
· Quando a gente se envolve em projetos de melhoria do financiamento em secretarias de saúde também ... o principal é fazer com que tanto os “que estão com o dinheiro na mão” como os que estão “com o paciente na frente” entendam detalhes deste conceito;
· O que se paga contratualizado, o que se paga contra apresentação, o que se complementa acima do valor da tabela básica, o que pode ser incrementado ... quando isso está “permeado na estrutura como um todo”, mesmo que não existam “professores doutores no assunto”, vem mais dinheiro para gastar, e o dinheiro que existe é melhor empregado em relação à demanda que a população necessita ... isso é o que importa ... aumentar o acesso da população ao SUS ... melhorar para a população.
Quando o Governo do Estado reajustou parte da tabela, ele “aproveitou” para reduzir (praticamente acabar) com o repasse fixo (o contratualizado), transformando praticamente tudo em contra apresentação:
· A contra apresentação tem como um grande benefício fazer com que o serviço de saúde “preguiçoso” não fique esperando “o dinheiro pingar na conta” sem se esforçar para produzir ... reduz a prática de “parar” quando a meta é atingida, se é que me entende !
· Para que este e outros benefícios ocorram, aquilo que o SUS paga mal ... aquilo que traz muito custo e receita baixa ... tem que estar contratualizado para pagamento fixo ... em um valor que compense para o serviço de saúde continuar fazendo o que “dá prejuízo”;
· O Governo pré-fixou o repasse para as “regionais de saúde”, e “desfixou” o repasse para os serviços de saúde ... ou seja ... com o mesmo dinheiro no bolso ela aumentou o que paga pelo “produto que compra” dos serviços de saúde.
É bem fácil entender o que está acontecendo no The Day After:
· Voce tem o mesmo dinheiro no bolso sempre ... imagine que é um funcionário e o seu salário não aumenta;
· E voce vai ao mercado comprar as coisas para sua casa ... e os preços não param de subir;
· O que voce faz: compra menos !
Fazendo analogia com o que vai acontecer com a produção agrícola do Rio Grande do Sul ... que Deus os ajude, e muito ... porque vai acontecer !
Estava conversando com um amigo sobre o que vai acontecer com a forte (excelente) produção agrícola no Estado do Rio Grande do Sul:
· Existem produtores familiares que “deram a alma” para construir sua propriedade, perderam tudo, vão pegar o dinheiro do seguro, financiamento do governo e vão se sacrificar muito para reconstruir toda uma vida ... é uma questão de vocação ser produtor na terra em que seus avós e pais nasceram ... e vão dar continuidade “na saga das gerações” de cada uma das suas famílias;
· E existem produtores que são meros investidores ... um dia fizeram contas e chegaram à conclusão que comprar terras e máquinas e produzir daria lucro maior que investir o dinheiro na bolsa;
· Estes últimos vão pegar o dinheiro do seguro e provavelmente não vão continuar plantando em locais onde a infraestrutura de logística foi destruída ... porque o lucro será menor do que investir na bolsa ... então vão produzir onde a remuneração é maior;
· Não tem certo ou errado na forma como um ou outro vai ser no “dia depois de amanhã” ... nenhum dos dois estará fazendo algo ilegal, imoral ou antiético ... vida que segue !
Fazendo a analogia com a Tabela SUS Paulista:
· Tem serviço que vai continuar produzindo a mesma coisa, sendo melhor remunerado em alguns procedimentos e continuando a ser mal remunerados em outros ... mais ou menos como o exemplo da agricultura familiar no RS;
· E tem serviços em que a lógica será: por que continuar produzindo o que remunera mal se eu posso concentrar a produção naquilo que agora está pagando melhor ? ... como o exemplo dos investidores da produção agrícola no RS;
· Também não tem nada de ilegal, imoral ou antiético em um ou em outro !
Para quem não é do ramo:
· Se voce faz baixa, média e alta complexidades, não tem como aumentar a produção da alta complexidade sem aumentar também a baixa e média ... elas não ocorrem de forma independente;
· Se não existe a consulta, não existe o diagnóstico que define a necessidade de cirurgia e não existe a cirurgia;
· Se voce vai fazer mais cirurgia porque a tabela está pagando mais, vai ter que fazer mais consultas e diagnósticos onde a tabela pagava praticamente nada, e vai continuar pagando praticamente nada !!
Se pegar o exemplo do HU da Unicamp, ou o exemplo da Santa Casa de São Paulo, a questão é: somos uma agricultura familiar que vai sobreviver na extrema dificuldade de financiamento, ganhando mais em alguns procedimentos para compensar “a paulada de custos com remuneração inadequada de outros” ?
Novamente é muito fácil entender o que está acontecendo com eles, sendo suficiente uma ilustração bem simples, como a da tabela acima. Fiz estudos para algumas instituições desde que a Tabela SUS Paulista aconteceu, para simular cenários que elas pensavam que seria uma coisa, e acabou sendo outra.
Esta “tabelinha” sintetiza estes estudos que evidentemente na realidade são mais abrangentes ... não mais complexo, apenas mais trabalhosos do que isso.
Imagine uma mesma lista de procedimentos, ilustrada pela coluna procedimentos:
· O grupo de colunas da esquerda simula o resultado da contratualização destes procedimentos antes da Tabela SUS Paulista. Tem “um perde e ganha” e o resultado deste “joguinho de azar” é um prejuízo para realizar os procedimentos de 3, mas a contratualização de 5 compensa o prejuízo, motivando o serviço de saúde a prestar serviço para o SUS;
· O grupo de colunas do meio aplica a Tabela SUS Paulista, aumentando a receita e o custo. Como o repasse passa a ser contra apresentação, o prejuízo na verdade acaba passando a ser 5, e sem a contratualização fixa anterior passa a ser prejuízo de 5. Mesmo se a contratualização anterior fosse mantida, a simulação do resultado seria 0 x 0, desmotivando o serviço de saúde para prestar serviço ao SUS;
· No grupo de colunas da direita a gente faz a mesma simulação anterior (das colunas do meio), mas eliminando os procedimentos que dão prejuízo, e o lucro passa a ser “gigante”.
O HU da Unicamp e a Santa Casa de São Paulo não são instituições que existem para distribuir lucros para acionistas:
· Não são investidores no mercado agrícola !
· Mas também não são instituições de agricultura familiar para bancar o prejuízo !!
· Então naturalmente devem se posicionar entre a coluna do meio e a coluna da direita, escolhendo o que vão continuar a fazer para que não tenham prejuízo.
São instituições de reputação ilibada:
· Fora de qualquer desconfiança de quererem aproveitar um erro de planejamento do Governo do Estado e “nadar de braçada na nova tabela” ... muito pelo contrário !
· Vão fazer ajustes para manter a sustentabilidade e continuar prestando o importantíssimo serviço que prestam para a população carente ... não tenha dúvida disso ... tenho segurança em afirmar isso porque conheço as duas instituições profissionalmente;
· Instituições que têm defeitos, como muitas e muitas instituições públicas e privadas que atuam no segmento da saúde têm ... mas têm muito, mas muito, mas muito mais virtudes do que defeitos !
Estes ajustes que cada instituição que presta serviço ao SUS “forçosamente” vão fazer, vão promover a desassistência da população nelas em alguma coisa, para que elas continuem fazendo o que sabem fazer melhor, e onde desempenham um melhor papel para o SUS:
· Estes ajustes devem promover a demissão de alguns profissionais em especialidades que vão deixar de ser o foco da instituição;
· E por outro lado devem promover a contratação de alguns profissionais em especialidades que a instituição passará a dar mais foco !
Esperamos que o Governo do Estado faça a sua parte no “dia depois de amanhã”:
· Avalie o impacto que a sua definição de reajustar o complemento apenas para ~35 % dos itens da tabela ...
· ... verificando onde a desassistência está sendo agravada;
· E onde isso estiver acontecendo, que ajuste as contratualizações para mitigar o dano;
Não dá para criticar o governo pelo que está ocorrendo ... ainda ! ... porque espera-se que esta análise e as ações de contingência já estejam no planejamento estratégico do projeto Tabela SUS Paulista;
· Ainda estamos comemorando a iniciativa, mesmo com estes percalços;
· Se os ajustes acontecerem, vamos ter certeza que foi uma ação para melhorar o SUS no Estado de São Paulo;
· Se não acontecerem, infelizmente vamos ter certeza que foi uma ação eleitoreira de consequências catastróficas, nem tanto para os serviços de saúde, mas para a população !
Vamos ver !
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Sobre o autor Enio Jorge Salu
CEO da Escepti Consultoria e Treinamento
Histórico Acadêmico
· Formado em Tecnologia da Informação pela UNESP – Universidade do Estado de São Paulo
· Pós-graduação em Administração de Serviços de Saúde pela USP – Universidade de São Paulo
· Especializações em Administração Hospitalar, Epidemiologia Hospitalar e Economia e Custos em Saúde pela FGV – Fundação Getúlio Vargas
· Professor em Turmas de Pós-graduação na Faculdade Albert Einstein, Fundação Getúlio Vargas, FIA/USP, FUNDACE-FUNPEC/USP, Centro Universitário São Camilo, SENAC, CEEN/PUC-GO e Impacta
· Coordenador Adjunto do Curso de Pós-graduação em Administração Hospitalar da Fundação Unimed
Histórico Profissional
· Pesquisador Associado e Membro do Comitê Assessor do GVSaúde – Centro de Estudos em Planejamento e Gestão de Saúde da EAESP da Fundação Getúlio Vargas
· Membro Efetivo da Federação Brasileira de Administradores Hospitalares
· CIO do Hospital Sírio Libanês, Diretor Comercial e de Saúde Suplementar do InCor/Fundação Zerbini, e Superintendente da Furukawa
· Diretor no Conselho de Administração da ASSESPRO-SP – Associação das Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação
· Membro do Comitê Assessor do CATI (Congresso Anual de Tecnologia da Informação) do Centro de Tecnologia de Informação Aplicada da Fundação Getúlio Vargas
· Associado NCMA – National Contract Management Association
· Associado SBIS – Sociedade Brasileira de Informática em Saúde
· Autor de 12 livros pela Editora Manole, Editora Atheneu / FGV e Edições Próprias
· Gerente de mais de 200 projetos em operadoras de planos de saúde, hospitais, clínicas, centros de diagnósticos, secretarias de saúde e empresas fornecedoras de produtos e serviços para a área da saúde e outros segmentos de mercado