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Mercado de Trabalho para Médicos no Brasil do Século 21
0392 – 13/07/2024
Ref.: Cursos Profissionalizantes em Gestão da Saúde, Geografia Econômica da Saúde no Brasil e Jornada da Gestão em Saúde no Brasil
Sistemas de financiamento tendendo a desincentivar bons profissionais na carreira de medicina no Brasil
(*) todos os gráficos e ilustrações são partes integrantes do Estudo Geografia Econômica da Saúde no Brasil e do material didático do Programa Cursos Profissionalizantes em Gestão da Saúde, dos cursos da Jornada da Gestão em Saúde e da Escepti
Semana passada tive a honra de ministrar novamente uma aula sobre planejamento estratégico em turma de pós do Einstein, oportunidade que sempre agradeço para a Profas. Glauce Roseane de Almeida Brito e Deise de Carvalho ... muito obrigado !
E entre outras coisas sempre acabo falando aos alunos para nunca esquecermos que tudo que ocorre na área de negócios da saúde nada mais é do que “um grande aparato de instituições”, públicas e privadas, explorando comercialmente a atividade básica dos médicos atendendo pacientes ... tudo ... absolutamente tudo ... que movimenta a geografia econômica da saúde no mundo gira em torno da definição da conduta do médico ao lidar com pacientes.
Qualquer planejamento que “esquece” isso, não tem a menor chance de sucesso !
Graças a Deus tive a oportunidade de ir entendendo a carreira dos médicos em situações muito diferentes: público, privado, benemerente, com fins lucrativos, generalistas, altamente especializados, prevenção da saúde, promoção da saúde ... especializados com foco clínico ... especializados com foco cirúrgico ... agradeço muito a oportunidade de ter tido a rara oportunidade de conviver profissionalmente nesta “diversidade gigante” até agora, e saber que ainda tem muita coisa sobre este “mercado” que eu nem desconfio que existe, e vou ter a oportunidade de aprender ... isso é fantástico !
Quando escuto uma criança dizer “que vai ser médico” quando crescer ... quando escuto um adolescente “no alto da sua sapiência” dizer que escolheu a carreira médica ... quando “esbarro” com estudantes de medicina ... até com residentes ... sempre penso: não faz a menor ideia do que será sua vida !!
· Este primeiro gráfico dá uma boa pista do que é ser médico no Brasil:
· Representa apenas informações do CNES no Estado de São Paulo ... mas “o Estado dos Bandeirantes” representa algo em torno de 40 % de todo o mercado de saúde no Brasil ... é uma boa amostra !
· Nós “fechamos” 2023 com 900.855 médicos atuando no Estado de São Paulo, ou seja, aproximadamente 900 mil seres humanos que praticam a medicina no Estado;
· A barra da direita demonstra que o médico, na média, atua em ~1,5 especialidades ... a menininha de 7 aninhos que diz que vai ser pediatra para cuidar de criança ... já ouviu isso ? ... não desconfia que a chance de praticar a medicina atuando em uma única especialidade é muito baixa ! ... é como se cada médico fosse 1 pessoa e meia !!
· O gráfico do meio demonstra que o médico, na média,, atua com 3 vínculos profissionais ... o adolescente que escolhe a carreira médica não desconfia que a chance de se formar e “trabalhar” em um único local é ainda mais baixa ! ... na média vai trabalhar em 3 instituições diferentes !!
· O gráfico da esquerda demonstra que para cada posto de trabalho ... para cada “vaga de emprego” em uma instituição ... existem em média 2 médicos atuando.
Acho que não preciso dizer que são “médias” ... que médias utilizamos para identificar tendências ... para entender cenários ... tem médico que atua em 3, 4 ... especialidades diferentes ... em 5, 6, 7 ... instituições diferentes !
Tem muita coisa parecida no mercado dos médicos quando a gente compara SUS e Saúde Suplementar ... mas tem coisas que são completamente diferentes:
· Os gráficos demonstram a evolução de postos de trabalho, especialistas e médicos entre 2017 e 2023 ... antes e após a pandemia;
· Nas linhas azuis o SUS, e nas linhas laranjas a saúde suplementar;
· No gráfico da esquerda é possível avaliar o aumento de postos de trabalho (vagas ... empregos ... vínculos ...) tanto no SUS como na SS é nítido ... e proporcional ... as linhas de tendência são quase paralelas ... crescem proporcionalmente as vagas no SUS e na SS;
· Mas o gráfico superior direito demonstra que o volume de especialistas que ocupam os cargos cresce mais no SUS do que na SS ! ... temos no SUS mais médicos representando papéis diferentes, ocupando o mesmo posto do que na SS;
· O gráfico inferior direito “sacramenta” esta tendência ... temos cada vez mais médicos atuando no SUS do que na saúde suplementar.
Para muita gente que “não milita” na área da saúde este último gráfico pode ser surpreendente ... para quem atua em gestão tanto no público como no privado como eu: surpresa nenhuma !
· Uns poucos médicos “se fartam” de ganhar dinheiro na saúde suplementar e adoram não ter que trabalhar no SUS;
· A maioria “não tem muita simpatia” com o que está acontecendo na saúde suplementar, especialmente na saúde suplementar regulada pela ANS;
· Na minha vida me deparei ... me deparo ... com uma maioria absoluta que trabalha no SUS e no seu consultório particular por vocação e, quando trabalha na saúde suplementar regulada pela ANS, o faz por necessidade ... ou luxo;
· Mais ou menos assim: ”o filet, o sorvete ...a viagem ... a vida de um padrão melhor do que a maioria da população do mundo ... pago com o dinheiro que ganha no SUS, e eventualmente com o dinheiro que ganha no consultório sem ter que passar por muita emoção ...
· ... “já o vinho um pouco mais caro, o carrão de dar inveja” é pago com o dinheiro que ganha com o complemento na saúde suplementar regulada;
· Só quem faz questão do “caviar”, ou “foi escolhido pelo destino”, atua com sucesso na saúde suplementar não regulada.
A maioria das crianças, adolescentes, residentes ... só vai aprender isso com o passar do tempo !
Este gráfico demonstra a distribuição percentual do vínculo dos médicos em postos de trabalho no Estado de São Paulo no final de 2023:
· Fala sério ! ... quantas profissões voce conhece que guardam tanta diversidade de tipos de vínculo como esta ?
· Talvez mais uma ou duas no máximo !
· Menos de 10 % dos vínculos de médicos com instituições é CLT !!
Vamos lembrar que um mesmo médico tem em média 3 vínculos ... pode ter, por exemplo, 1 como CLT, 1 como pessoa jurídica e 1 como pessoa física !
Mesmo assim ... CLT não é maioria neste cenário ... a maioria não é celetista !
E a tendência é reduzir cada vez mais o vínculo celetista:
· O gráfico demonstra a evolução dos principais vínculos dos médicos no Estado de São Paulo;
· As barras azuis, quanto percentualmente o vínculo representava sobre o total em 2017 ... as laranjas em 2023;
· Celetista reduziu ... e bem !
· Pessoa física com redução discreta ... cooperado com aumento discreto;
· Pessoa jurídica, temporário / prazo determinado, e autônomo aumentou ... e bem !
Chega a ser engraçado:
· ... em uma profissão onde uma das coisas que a gente mais valoriza é a interação pessoal, o calor humano, o ser humano cuidando do ser humano ...
· ... o médico cada vez mais representando “uma empresa” do que uma pessoa ...
· ... quando se trata de vínculo, é bom não esquecer do que estamos falando aqui !!
Quando estávamos naqueles gráficos lá de cima de tendência de evolução que demonstram que o número de médicos aumenta proporcionalmente mais no SUS do que na saúde suplementar, ficou nítido que a saúde suplementar regulada pela ANS tem sido um “desestímulo” à carreira médica.
Estes gráficos demonstram isso:
· A evolução do volume de médicos residentes entre 2017 (12.7782) e 2023 (15.541) de “apenas” 21,6 % ...
· ... ~11 % menor que a evolução do volume total de médicos (32,1 %);
· Uma coisa é abrirmos mais vagas em cursos de medicina, como estamos fazendo há alguns anos, especialmente neste período entre 2017 e 2023 ...
· ... outra coisa é este estudante ir até o final do curso, fazer residência e exercer a medicina ! ... na própria região em que se formou e se especializou;
· O Estado de São Paulo está demandando (ofertando) mais vagas para médicos do que as vagas de residência que ele mesmo oferece;
· A pergunta é: até quando o Estado de São Paulo vai conseguir “importar” médicos de outros Estados para suprir sua necessidade ?
Não tenho números para demonstrar esta relação de escassez ... vou me atrever a dar uma opinião subjetiva ... baseada na minha observação pessoal, no meio que atuo profissionalmente ...
· ... este momento já chegou há algum tempo !
· O Estado de São Paulo sofre com a escassez de médicos correspondente a sua necessidade .... principalmente na saúde suplementar regulada ...
· ... o sistema de financiamento regulado pela ANS, que não tem nem o médico nem o beneficiário do plano de saúde como foco ...
· ... que tem como foco regular a saúde financeira da operadora, e não a assistência médica ...
· ... tende a desmotivar cada vez mais o estudante de medicina a terminar seu curso.
Por isso temos uma evolução de 45,7 % de postos de trabalho médico, mas apenas 32,1 % de médicos !
· Será que existe indicador mais significativo do que este ?
· Os mesmos médicos ocupando cada vez mais postos de trabalho ! ... por falta de outros é claro !
· A criança que está hoje pensando em medicina quando crescer terá que trabalhar proporcionalmente em mais postos de trabalho simultaneamente do que seus pais trabalham hoje !!
· Quer desestímulo maior do que este ?
O mercado de trabalho médico está permeado de “mantras” do sistema de financiamento que são absolutamente nocivas ao que a população necessita ... nocivos ao que a vocação dos médicos quer ...
O gráfico da esquerda demonstra que temos proporcionalmente crescimento de postos de trabalho de pediatra em relação ao de ginecologistas e obstetras:
· Embora seja uma relação adequada, afinal necessitamos mais de pediatras que acompanham a vida da criança até se tornar adulto, do que de obstetras e ginecologistas que atuam em momentos específicos da vida das mulheres ... mais volume de atendimento a uma criança/adolescente do que para mulheres grávidas ou não ...
· ... a pergunta é: esta proporção que vemos no gráfico é adequada (o dobro de uma em relação à outra) ?
· Não deveríamos ter muito mais que o dobro de pediatras do que Gineco/Obstetras ?
· Acho que todos concordam que sim !
· Mas só quem trabalha nos sistemas de financiamento sabe em detalhes que esta proporção não é maior porque o modelo de remuneração, especialmente na saúde suplementar regulada, prejudica a vocação do médico em cuidar de crianças e adolescentes ... neste sistema de financiamento a remuneração dele é muito menor do que a do Ginecologista/Obstetra !
· E é claro que a remuneração acaba pesando na vocação do médico ... pesa na vocação de qualquer profissional de qualquer atividade ... com médicos não poderia ser diferente.
O gráfico da direita, no Estado de São Paulo, é “mais que revelador” em relação a isso:
· Nosso Estado tem uma das menores taxas de natalidade em relação a maioria do restante do Brasil ...
· ... e é um dos Estados com maior taxa de longevidade ... de pessoas com mais idade;
· Então porque temos uma quantidade “enormemente maior” de ginecologistas e obstetras do que de geriatras ?
· E, pior, porque a taxa de evolução de geriatras, que são poucos, é menor do que a dos ginecologistas e obstetras ?
· É só ver como o sistema de financiamento, especialmente a saúde suplementar regulada, remunera o ginecologista, o obstetra, e o geriatra para ter a resposta;
· A questão não é falta de demanda para o geriatra ... é falta de motivação financeira para que ele atue ... é disso que se trata !
Os sistemas de financiamento têm discrepâncias realmente só explicáveis “pela lei do holerite” ...
Temos absurdamente mais médicos anestesistas do que intensivistas:
· Faça um levantamento de quantas horas os pacientes passam sob cuidados de anestesistas, e quantas horas os pacientes passam sob cuidados de intensivistas;
· Pode “pegar’ um hospital ... um grupo de hospitais ... todos os hospitais ... somente SUS ... somente saúde suplementar ... escolha a mostra que quiser !
· O tempo empenhado por intensivistas diretamente no cuidado de pacientes em qualquer amostra é muito ... mas muito maior que o dos anestesistas ... pelo tempo gasto deveríamos ter muito mais intensivistas do que anestesistas;
· Mas “pegue” o valor hora de remuneração de um anestesista e de um intensivista para entender porque temos mais anestesistas do que intensivistas ... especialmente na saúde suplementar regulada pela ANS !
Temos muito mais neurologistas do que neurocirurgiões:
· Procure levantar a dificuldade de autorizar junto a uma operadora (qualquer uma delas) um tratamento neuro clínico em relação a dificuldade de autorizar um tratamento neurocirúrgico ... pergunte para quem trabalha com isso !
· Vai entender que não temos poucos neurocirurgiões apenas porque a especialização é mais complexa ... mas também porque a regulação na saúde suplementar nesta especialidade é mais do que desmotivadora para quem se atreve a atuar nela !
· Vai escutar “zilhões” de casos em que o paciente com risco de vida fica “penando” para conseguir autorização para um procedimento cirúrgico ... insisto ... pergunte para quem trabalha com isso se é exagero meu !
A verdade é que quem escolhe a carreira assistencial ... medicina, enfermagem, fisio, e tantas outras ... com os sistemas de financiamento continuando a dar foco no balanço financeiro da operadora, e não na assistência ... terá que ter como motivação cada vez mais a vocação, e cada vez menos a sua própria qualidade de vida.
Olha ... nem falo que falta na regulação preocupação com a qualidade assistencial (e falta) ... falo que falta foco na preocupação com a assistência ... qualidade então, nem se fala !
Quanto escuto a criança dizer que quer ser médico hoje, na verdade não penso somente que ela não sabe o que a espera ... na verdade torço para que ela não desista quando ficar sabendo ! ... afinal, torcer para que a pessoa tenha um ideal e lute por ele não é pecado algum !
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Contato contato@escepti.com.br
Sobre o autor Enio Jorge Salu
CEO da Escepti Consultoria e Treinamento
Histórico Acadêmico
· Formado em Tecnologia da Informação pela UNESP – Universidade do Estado de São Paulo
· Pós-graduação em Administração de Serviços de Saúde pela USP – Universidade de São Paulo
· Especializações em Administração Hospitalar, Epidemiologia Hospitalar e Economia e Custos em Saúde pela FGV – Fundação Getúlio Vargas
· Professor em Turmas de Pós-graduação na Faculdade Albert Einstein, Fundação Getúlio Vargas, FIA/USP, FUNDACE-FUNPEC/USP, Centro Universitário São Camilo, SENAC, CEEN/PUC-GO e Impacta
· Coordenador Adjunto do Curso de Pós-graduação em Administração Hospitalar da Fundação Unimed
Histórico Profissional
· Pesquisador Associado e Membro do Comitê Assessor do GVSaúde – Centro de Estudos em Planejamento e Gestão de Saúde da EAESP da Fundação Getúlio Vargas
· Membro Efetivo da Federação Brasileira de Administradores Hospitalares
· CIO do Hospital Sírio Libanês, Diretor Comercial e de Saúde Suplementar do InCor/Fundação Zerbini, e Superintendente da Furukawa
· Diretor no Conselho de Administração da ASSESPRO-SP – Associação das Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação
· Membro do Comitê Assessor do CATI (Congresso Anual de Tecnologia da Informação) do Centro de Tecnologia de Informação Aplicada da Fundação Getúlio Vargas
· Associado NCMA – National Contract Management Association
· Associado SBIS – Sociedade Brasileira de Informática em Saúde
· Autor de 12 livros pela Editora Manole, Editora Atheneu / FGV e Edições Próprias
· Gerente de mais de 200 projetos em operadoras de planos de saúde, hospitais, clínicas, centros de diagnósticos, secretarias de saúde e empresas fornecedoras de produtos e serviços para a área da saúde e outros segmentos de mercado