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Maiores pecados na regulação da ANS que prejudicam os beneficiários e o SUS

0395 – 06/08/2024

Ref.: Cursos Profissionalizantes em Gestão da Saúde, Geografia Econômica da Saúde no Brasil e Jornada da Gestão em Saúde no Brasil

Erramos ao permitir a existência de uma saúde suplementar, que não é nem suplementar, nem complementar

 

(*) todos os gráficos e ilustrações são partes integrantes do Estudo Geografia Econômica da Saúde no Brasil e do material didático do Programa Cursos Profissionalizantes em Gestão da Saúde, dos cursos da Jornada da Gestão em Saúde e da Escepti

Se tiver expectativa de que a intenção do texto é criticar o governo atual, ou o governo anterior ... a gestão atual da ANS, ou a gestão anterior ... por favor, não perca seu tempo lendo o texto ... é um texto técnico que aponta erros de uma regulação inadequada porque não existe mecanismo prático real que possa corrigir o rumo que demos para a saúde suplementar no Brasil. Não é culpa de um governante, ou  de um gestor da ANS ... é culpa da definição constitucional que acaba permitindo que o SUS seja prejudicado pela saúde suplementar ... enquanto as definições constitucionais forem estas ... enquanto o papel da ANS for este ... este cenário não tem muito como mudar, infelizmente ! ... isso posto ...

A figura ilustra 9 falhas na regulação da saúde suplementar:

·         Reforçando que a regulação não é decisão discricionária de uma pessoa ... é de estranhar que um grupo, com ou sem participação da sociedade, não tenha dado foco nas consequências das falhas;

·         A consequência, ao contrário do que a maioria das pessoas podem pensar, não se limita a relação operadora de plano de saúde x beneficiário de plano de saúde;

·         Algo mal regulado na saúde suplementar invariavelmente tem como resultado o desvio dos recursos financeiros do SUS para beneficiar instituições que deveriam, ou arcar integralmente com os custos, ou direcionar estes custos para que fossem pagos pelo financiador da relação que financia a saúde privada (a operadora, ou o beneficiário, ou a empresa contratante, ou o cidadão, este último chamado de “particular”);

·         O foco da discussão aqui é como algumas coisas da regulação não inseriram na agenda a consequência do seus gaps ... dos seus defeitos ... no sistema de financiamento da saúde pública ... o nosso SUS.

Existem dezenas de gaps na regulação da saúde suplementar ... não somente esses 9:

·         O maior “pecado” ... o que mais prejudica beneficiários de planos de saúde ... o que não existe justificativa para que a regulação não seja modificada ... vamos deixar para um texto posterior ... específico ... ele merece ser destacado ... combinado ?

·         Estão elencados aqui os outros de maior impacto ... existem muitos mais “jogando custos debaixo do tapete do SUS”;

·         São exemplos ... ilustrações ... que demonstram que construímos uma saúde suplementar que não é nem suplementar, nem complementar.

Para entender os termos suplementar e complementar, podemos fazer analogia com nutrição (comida – alimentação) ... algo mais frequente no dicionário das pessoas:

·         Quando alguém faz uso de uma alimentação suplementar ... um suplemento ... está buscando algum ingrediente alimentar que necessita, e que na alimentação comum não existe na quantidade que necessita ... um suplemento de ferro, proteína ou algo do tipo que está necessitando em quantidade maior do que pode absorver na alimentação comum ... para que pudesse obter esta quantidade teria que “comer um caminhão de bananas” para suprir uma necessidade de potássio, por exemplo !

·         Já a alimentação complementar é a comum, dosada de forma diferente ... em quantidade diferente ... ou com variedade diferente ... basta se alimentar com o cardápio comum que suas necessidades alimentares serão supridas, bastando adequar o cardápio e/ou o volume de alimentos.

Infelizmente a saúde suplementar que construímos aqui no Brasil não é suplementar:

·         São raros ... muito raros ... extremamente raros ... os procedimentos que necessitamos que não existem no SUS e existem na saúde suplementar;

·         Quem tem plano de saúde não paga porque no plano vai ter algo que o SUS “não cobre”;

·         Faz isso por outras razões: não quer “se misturar” com as pessoas que são atendidas nos serviços públicos de saúde, e/ou quer um nível de hotelaria melhor, e/ou  quer escolher o médico / o serviço de saúde, e/ou não quer esperar ou ficar na  fila (quer atendimento rápido ou furar a fila) ... não tem nada de suplementar nisso !

E infelizmente a saúde suplementar que  construímos no Brasil não é nem mesmo complementar ... não é complementar da forma como era no passado:

·         No passado a disponibilidade ... o acesso ao tratamento ... era muito mais rápido para quem tinha plano de saúde;

·         Especialmente na última década, na média, a saúde suplementar tem sido um fracasso em relação a isso;

·         As restrições de acesso são enormes ... em algumas regiões do Brasil (não em todo o SUS) para uma boa parte dos procedimentos a fila de espera no SUS é praticamente a mesma da saúde suplementar ... em algumas especialidades o tempo de espera no SUS surpreendentemente é menor do que na saúde suplementar !

Isso pode ser comprovado estatisticamente com a evolução das NIPs contra as operadoras ...

·         ... ou pelo volume de judicalizações contra operadoras, quando o beneficiário cansa de esperar, ou não quer esperar ...

·         ... ou, no meu caso que atuo profissionalmente tanto em hospitais como em operadoras, acompanhando a realidade ... o dia a dia ... a rotina de pessoas aflitas que esperam em filas na saúde suplementar, muitas vezes correndo risco de vida ... um absurdo;

·         Atendimentos presos em burocracias propositalmente desenvolvidas para “conter a sinistralidade”;

·         Para trocar saúde suplementar por saúde complementar teríamos que ter uma boa dose “de cegueira e surdez”, se é que me entende !

Vale a pena passar por estes pontos elencados como “pecados” para entender como isso prejudica o financiamento do SUS.

 

 

 

É comum um paciente ser atendido na saúde suplementar para realizar um procedimento e ter a continuidade do tratamento no SUS:

·         Seria adequado se o tratamento sequente não tivesse nada a ver com o primeiro, mas é comum que aconteça no tratamento da mesma doença ... do mesmo evento base ... isso não é adequado !

·         O Rol da ANS, pelo menos é o que temos como premissa, não existe para autorizar determinados procedimentos e não autorizar outros na mesma cadeia de eventos assistenciais de uma mesma doença ...

·         ... o contrato entre operadora e serviço de saúde, ou mesmo o vínculo da operadora com seu próprio serviço de saúde, não deveria sob nenhuma hipótese interromper o tratamento de uma doença sob alegação de não cobertura, independente da sequência se referenciar a algo que não está no Rol, ou falta de abrangência contratual;

·         Estamos “falando” sobre doença ... não da compra de um produto supérfluo !

·         O plano de saúde deveria suportar os custos de todo o ciclo de tratamento da doença, integralmente, independente de ter algo no Rol

Quando um paciente, por exemplo, faz uma cirurgia na saúde suplementar e a reabilitação no SUS, onera o SUS 2 vezes ...

·         ... primeiro que a reabilitação deveria estar sendo feita também na saúde suplementar, e não no SUS ...

·         ... e segundo porque a equipe assistencial que acolhe o paciente no SUS “começa do zero” no início da interação com ele, podendo inclusive lidar com um paciente vítima de sequelas de um procedimento mal realizado pela equipe antecessora !

·         Um evento adverso que poderia não ter ocorrido no SUS, ou seja, não somente reabilitar a partir de um procedimento, mas consertar o erro de um procedimento.

É muito difícil estimar o custo assumido indevidamente pelo SUS em relação a isso ... mas ...

·         Estimando que apenas 1 % do total das despesas das operadoras esteja associado a procedimentos que têm a sequência assistencial no SUS (é mais do que isso !)

·         E que a sequência represente 50 % do custo da cirurgia (é mais do que isso !!)

·         O custo indevido que está “caindo no colo do SUS” teria sido 1,5 bilhões em 2023 ... não é pouco dinheiro !!!

 

 

Existe uma infinidade de serviços de saúde que atendem SUS e Saúde Suplementar simultaneamente:

·         Existe uma longa discussão ... décadas de discussão, na verdade ... se isso deveria ser permitido pela lei / regulação;

·         Sou plenamente favorável que seja permitido, porque a receita que as instituições idôneos captam na saúde suplementar melhora sensivelmente o atendimento dos atendimentos que eles realizam para o SUS ... mas olha: melhoram muito mesmo ... nas inúmeras instituições idôneas que tive a honra de atuar profissionalmente é assim ... sou testemunha !

·         Mas isso dá a oportunidade para instituições não idôneas “transferir” pacientes inadimplentes financeiramente na saúde suplementar para o SUS ...

·         ... nem estou falando de instituições que possam fazer isso premeditadamente desenhando um “bem bolado” já combinando fazer uma parte na saúde suplementar e o resto no SUS desde o diagnóstico ... antes mesmo do tratamento ...

·         ... estou falando das que acolhem o paciente na saúde suplementar sem avaliar o risco financeiro ... a garantia financeira do cliente ... e quando esgota a capacidade dele de honrar a dívida, é encaminhado para o SUS.

Se isso é feito, além de “orquestrar” um furo na fila do SUS, ainda transfere para o SUS um custo que deveria ser absorvido por quem, livremente, escolheu atuar na saúde suplementar ... e deve arcar com “os riscos do negócio” ... inserir o risco no seu plano de negócios para se viabilizar e não utilizar o SUS como ferramenta de viabilização !

Se estimarmos que apenas 0,5 % (certamente deve ser mais que isso) do custo da saúde suplementar é transferido para o SUS nestas condições ... temos aí mais R$ 1,5 bilhões de custos que não deveriam estar no SUS, e sim na área privada !

 

 

A fila de transplante de órgãos é única no Brasil:

·         Graças a Deus que é única ! ... imagine se não fosse ... sendo única já favorece algumas pessoas da fila por questões de logística, que são técnicas (não fraudulentas) ... imagine se não fosse ! ... somente uma minoria da minoria da minoria da população mais “bastada” de recursos financeiros teria acesso;

·         Mas quem atua profissionalmente no segmento vê coisas que são “invisíveis” para a maioria das pessoas;

·         Uma delas é, ao aferir a fila dos pacientes em serviços públicos, identificar pessoas que vão fazer o transplante pelo SUS, mas uma boa parte deles tem plano de saúde;

·         E não existe nada na regulação da saúde suplementar que impeça que estes transplantes sejam feitos pelo SUS ... nada que obrigue que a operadora de planos de saúde arque com os custos do procedimento;

·         Operadoras (nem todas, é bom que se diga), sem infringir nenhuma lei deixa, simplesmente deixa que o procedimento seja realizado pelo SUS ...

·         ... para depois pagar pelo tratamento através do ressarcimento ... que é o preço SUS + 50 % na maioria dos casos.

Preço SUS + 50 % é, desculpe o termo, é um preço ridículo perto do que a operadora pagaria se honrasse o pagamento ao serviço de saúde pelas práticas de precificação da saúde suplementar ...

·         ... deixa lá no SUS ! ... pra quê acolher ele no fluxo de pacientes da operadora e agravar a sinistralidade ?

·         Infelizmente esta prática não é ilegal ! ... e existe !!

Os repasses do SUS para transplantes (grupo 5 da Tabela SIGGTAP) somaram 1,3 bilhões em 2023:

·         E o ciclo de atendimento dos transplantados não fica só nos atendimentos em que o procedimento principal é do grupo 5 ... o gasto é muito, mas muito maior do que isso !

·         Se este repasse fosse valorizado pelas práticas de precificação da saúde suplementar, seria algo em torno do triplo !

·         Se somente ¼ das pessoas que estão na fila de transplantes têm plano de saúde (seguramente é mais que isso), temos aí mais ~ R$ 1 bilhão de prejuízo para o SUS !

 

 

Um dos maiores “crimes” da regulação da ANS é permitir que os planos tenham coparticipação, franquia, reembolso:

·         Em um sistema de financiamento que tem o nome de “suplementar” é mais do que evidente que a assistência ao beneficiário que necessita deste suplemento seja ... sem limites ... sem pegadinhas ... senão não cabe o termo suplementar ... o que o beneficiário espera do plano é que seja suplementar;

·         Infelizmente a regulação seguiu o caminho de achar que, porque alguns beneficiários podem deliberadamente querer fraudar a assistência, inserindo desperdício na sinistralidade, todos devem pagar por isso ! ...

·         ... todos os que não fraudam ... todos os que não desperdiçam ... que são a maioria ... pagam por “um crime que não cometem” ... injusto !

Então, os casos de coparticipação, franquia e reembolso fixo podem sugerir que o beneficiário de plano escolha fazer toda a baixa complexidade no SUS, onde não existe nada disso, e utilize o plano de saúde apenas para atendimentos de média e alta complexidades, ficando assim isentos de pagamento de coparticipação !

É impossível estimar o custo que tudo isso significa para o SUS ... mas é grande ... só para exemplificar um caso ... a coparticipação em atendimentos de baixa complexidade:

·         Supondo que metade da sinistralidade das operadoras é de atendimento externo ...

·         ... que nos atendimentos externos apenas 30 % do custo é de consulta e exames de baixa complexidade (seguramente é mais que isso) ...

·         ... que destes atendimentos de baixa complexidade apenas 30 % dos planos tenham coparticipação (é mais que isso) ...

·         ... que destes atendimentos com coparticipação de consultas e exames, a coparticipação seja de 40 % (é a média do mercado) ...

·         ... esta “continha” dá 1,1 bilhões !

Lembrando ... somente coparticipação ... sem citar franquia e limite de reembolso ... e o exemplo se refere somente a  coparticipação de consultas e exames ...

... tem mais sobre coparticipação ... mais catastrófica ainda, é bom que se diga ...

 

 

O maior desagravo ao beneficiário do plano e ao SUS ... quando se trata de coparticipação ... onde a regulação da ANS “beira o absurdo”:

·         Internações de psiquiatria, com coparticipação após 30 dias de internação ! ... é inacreditável que isso seja permitido pela regulação ... impossível alguém pensar que isso seja minimamente aceitável !!

·         Quem já atuou em hospitais psiquiátricos (tive a honra de atuar em nada menos que 5) sabe o risco que isso significa ... o paciente com transtornos mentais se não tiver atenção integral em todo o tempo que necessitar, pode ser um suicida;

·         Cobrar dele para continuar um tratamento que ultrapassa 30 dias pode ter o pior desfecho que possa existir ...

·         ... é o cúmulo do absurdo !

·         O desfecho de um tratamento que deveria ser entregar a cura, ou mitigar o dano, neste caso é motivo de agravamento do quadro de paciente e familiar que buscaram o plano / serviço por necessidade relacionada a transtorno mental.

Na mesma linha: ao invés de desenvolver mecanismos de qualidade assistencial para reduzir o desperdício, utilizam o sistema de financiamento para “penalizar” tanto os fraudadores (os aproveitadores) que são poucos ... e neste caso específico, raríssimos ... como os necessitados, que são muitos ... nada justifica isso !

Mas a regulação ainda é pior do que isso:

·         Algumas operadoras se aproveitam de uma “brecha” na no texto da legislação para transferir a cobrança desta coparticipação para o serviço de saúde ... imagine só o tamanho deste absurdo !

·         Coparticipação em consultas, exames ... tudo é cobrado pela operadora do beneficiário / empresa contratante ... nenhuma operadora que eu conheço em anos e anos de atuação profissional permite que o serviço de saúde cobre a coparticipação do beneficiário ... é comum inclusive (em quase 100 % dos casos) que o contrato entre operadora e serviço de saúde tenha uma cláusula “grafando que nada pode ser cobrado do beneficiário” ...

·         ... mas coparticipação em internação psiquiátrica pode ... dá pra entender ?

Justamente no caso de internação psiquiátrica, onde a mente do paciente, do familiar, do responsável ... deveria ser o foco do tratamento, os afetados (beneficiário, familiares ...) são impelidos a ficar pensando em questões financeiras ...

·         ... a operadora “força” o serviço a cobrar a coparticipação diretamente do paciente !

·         Além de não honrar com o seu compromisso, ainda dá abertura para que o serviço de saúde cobre o que quiser do paciente ...

·         ... se é que me entende ... um “prato feito” para que serviços de saúde também possam, se não forem empresas idôneas, se aproveitar inadequadamente da falha absurda da regulação !

Não dá para estimar o valor disso ... certamente muito, mas muito maior que o cálculo que fizemos referente à coparticipação para consultas e exames ... então, não erramos ao afirmar que isso representa mais do que R$ 1 bilhão !

 

 

O ressarcimento das operadoras ao SUS se dá somente nos procedimentos de internação, e em regime ambulatorial de média e alta complexidades:

·         A tabela ilustra que este ressarcimento beira 1 bilhão de reais (R$ 950 milhões);

·         Se estimarmos que a baixa complexidade que acontece no SUS a partir destes dados seja de somente 40 % do ambulatorial MAC, temos 200 milhões de reais que deixam de ser repassados ao SUS pelas operadoras.

O valor é muito maior que este ... entendendo:

·         Quem tem plano de saúde com cobertura somente hospitalar ...

·         ... boa parte de quem tem plano de saúde com coparticipação ...

·         ... todo o pré-operatório que aconteceu no SUS relacionada às internações ...

·         ... toda a reabilitação que aconteceu no SUS após a internação ...

·         ... tudo isso fica “debaixo do tapete” ! ... não entra na conta do ressarcimento !!

·         Estimar apenas R$ 200 milhões é “dinheiro de pinga” perto do valor real que desconhecemos !!!

 

Interface gráfica do usuário, Texto, Aplicativo

Descrição gerada automaticamente

 

O ressarcimento das operadoras ao SUS é baseado no preço da Tabela SIGTAP, a média com acréscimo de 50 %:

·         Um valor, na média, 4 vezes menor do que a operadora gastaria de o atendimento fosse realizado na sua rede própria ou credenciada;

·         Evidentemente esta prática não incentiva a operadora a evitar ao máximo que seu beneficiário seja atendido na rede pública ... na verdade: muito pelo contrário !

Se o ressarcimento fosse feito a partir de preços praticados na própria saúde suplementar teríamos um acréscimo de ~1,2 bilhões de reais para o SUS !

 

 

O ressarcimento ao SUS é destinado ao FNS, e não diretamente ao serviço de saúde que realizou o atendimento do beneficiário do plano de saúde:

·         Não existe motivação para que o serviço pratique com a maior acuracidade possível, tanto a identificação do paciente como a adequada formação da conta que é apresentada ao SUS;

·         Nem motivação para o serviço “brigar” pela apresentação de uma conta que não está associada ao plano orçamentário (a FPO), ou seja, se o atendimento foi, por exemplo, de uma especialidade não contratualizada na FPO, a conta não vai para o SUS ... na verdade, se for, é recusada pelo processo de crítica da contratualização;

·         Ou seja ... muitas contas podem não ter a identificação adequada do paciente para poder entrar no sistema de ressarcimento ... muitos atendimentos não entram no repasse do SUS para o serviço, e consequentemente não podem entrar no sistema de ressarcimento ... muitas contas apresentadas ao SUS tem valor inferior ao que teriam se o serviço se motivasse a “contabilizar” tudo que as contas podem ter ... um show de horror !!!!

Tem muito dinheiro que não aparece no ressarcimento por conta disso ...

... sabemos que é muito, mas não temos ferramenta para contabilizar ...

... e o próprio “sistema” não foi desenhado para identificar !

Mas não é nenhum crime estimar que o ressarcimento seria pelo menos 25 % maior se, ou o total ou parte disso, fosse para o próprio serviço de saúde ... e não 100 % para o FNS distribuir pela rede assistencial do SUS.

E 25 % de acréscimo significa algo em torno de R$ 300 milhões !

 

 

Quando analisamos as ABIs (os documentos apresentados pela ANS para as operadoras), é muito evidente discernir que aquele paciente que realizou o procedimento de média ou alta complexidade na rede pública “não surgiu do nada” ...

·         Para ser acolhido para um procedimento de média e alta, em quase 100 % dos casos, ele teve que passar pela baixa para entrar na regulação ... para conseguir a vaga !

·         E depois do procedimento não vai desaparecer do SUS ...  vai retornar para o acompanhamento básico:

·         Ela, após o parto, não vai deixar de retornar no médico que fez o parto pelo menos uma vez ... não vai deixar de fazer os exames que o próprio SUS prescreveu para ela fora do SUS;

·         Quem fez uma artroplastia de joelho, uma colecistectomia, uma herniorrafia, varizes ... não vai deixar de retornar com o cirurgião ... não vai deixar de fazer os exames e os tratamentos que ele prescreveu fora do SUS.

·         Se estimarmos que o custo do ciclo ambulatorial é metade do custo do ciclo da alta complexidade, e que somente metade cumpre este ciclo no SUS, temos R$ 450 milhões !

 

 

Bem ... se considerarmos tudo, vamos chegar à conclusão que o SUS é onerado em no mínimo ... mínimo mesmo conforme foram sendo expostos cada item ... é muito mais que isso ... mas no mínimo 10 bilhões de reais por ano !

Tem muita gente que vai ler este texto e dizer que 10 bilhões perto do orçamento do SUS (mais de 230 bilhões em 2024) não é nada !

·         Realmente, significa algo em torno de apenas 5 % ... isso é fato;

·         Mas estes 5 % a mais daria para o SUS financiar 4 milhões de meio de partos normais ...

·         ... ou mais de 8 milhões de hemorroidectomias ...

·         ... ou quase 2 milhões de artroplastias de quadril ...

·         ... ou mais de 1 milhão e meio de radioterapias de mama ...

·         ... ou mais de 80.000 transplantes de fígado !

·         Vejam as filas do SUS por falta de dinheiro e o quanto “estes míseros 10 bilhões” que a saúde suplementar regulada “joga no colo do SUS” poderiam ajudar !!!!!

Mas o pior desse cenário nem é isso ... isso é muito grave, mas não é a pior coisa !

O que está em jogo aqui principalmente é que, para economizar R$ 10 bilhões por ano, a Saúde Suplementar prejudica a assistência:

·         De milhões de pessoas que tem plano de saúde e tem que recorrer ao SUS porque o produto saúde suplementar “não vale o que pesa” !

·         E de milhões de pessoas que só tem o SUS como recurso para tratar da saúde, e tem menos acesso do que poderiam ter se os beneficiários de planos de saúde fossem atendidos, com todo o direito, na rede privada e não na rede pública;

Quer mais argumento do que este para voltar na afirmação de que não temos no Brasil nem uma saúde suplementar nem uma saúde complementar ?

Vamos reforçar o que foi dito lá no início ... não dá para culpar somente a ANS por estes pecados ... não é justo fazer isso !

Qualquer regulação que existe, a respeito de qualquer coisa, “é fruto” ...

·         ... da participação da sociedade – se ela não participa ativamente “tem culpa no cartório” ...

·         ... das articulações das instituições interessadas – no caso de planos de saúde: das operadoras, dos serviços de saúde, das entidades de classe representativas das empresas e dos profissionais que atuam na área da saúde ...

·         ... da anuência de quem “compra” o produto, no caso de planos de saúde, as pessoas físicas que adquirem planos individuais e coletivos por adesão, e as empresas que adquirem planos de saúde para seus funcionários;

·         ... do governo, aí incluso o legislativo, executivo e judiciário, em todos os âmbitos (federal, estadual, distrital e municipal) que além de intermediar o interesse público, são também consumidores deste “produto”.

A ANS tem sua parcela de culpa, que é a mais significativa, porque é a instância que lida constantemente com os eventos adversos da sua própria regulação ... mas está longe de ser uma regulação “ditatória” que emana da cabeça de um dirigente específico ... toma “decisões colegiadas” ... o que é necessário mudar é a dinâmica “deste colegiado” que “só olha para o próprio umbigo” da saúde suplementar, se é que me entende !

Isso posto: o que é necessário é uma mobilização geral para tentar recuperar este produto chamado “plano de saúde no Brasil” que, ao contrário do que ocorre com a maioria absoluta de todos os produtos no mundo, só piora ao longo do tempo ... os produtos no mundo vão evoluindo para melhorar o nível de satisfação dos consumidores ...

·         ... mas os planos de saúde no Brasil vêm e vão definhando ... não está certo isso !

·         E está menos certo ainda que, para dar sustentabilidade ao privado (para as operadoras), o público (o SUS) seja cada vez mais prejudicado ... é somente disso que se trata o texto !

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Sobre o autor Enio Jorge Salu

CEO da Escepti Consultoria e Treinamento

Histórico Acadêmico

·  Formado em Tecnologia da Informação pela UNESP – Universidade do Estado de São Paulo

·  Pós-graduação em Administração de Serviços de Saúde pela USP – Universidade de São Paulo

·  Especializações em Administração Hospitalar, Epidemiologia Hospitalar e Economia e Custos em Saúde pela FGV – Fundação Getúlio Vargas

·  Professor em Turmas de Pós-graduação na Faculdade Albert Einstein, Fundação Getúlio Vargas, FIA/USP, FUNDACE-FUNPEC/USP, Centro Universitário São Camilo, SENAC, CEEN/PUC-GO e Impacta

·  Coordenador Adjunto do Curso de Pós-graduação em Administração Hospitalar da Fundação Unimed

Histórico Profissional

·  Pesquisador Associado e Membro do Comitê Assessor do GVSaúde – Centro de Estudos em Planejamento e Gestão de Saúde da EAESP da Fundação Getúlio Vargas

·  Membro Efetivo da Federação Brasileira de Administradores Hospitalares

·  CIO do Hospital Sírio Libanês, Diretor Comercial e de Saúde Suplementar do InCor/Fundação Zerbini, e Superintendente da Furukawa

·  Diretor no Conselho de Administração da ASSESPRO-SP – Associação das Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação

·  Membro do Comitê Assessor do CATI (Congresso Anual de Tecnologia da Informação) do Centro de Tecnologia de Informação Aplicada da Fundação Getúlio Vargas

·  Associado NCMA – National Contract Management Association

·  Associado SBIS – Sociedade Brasileira de Informática em Saúde

·  Autor de 12 livros pela Editora Manole, Editora Atheneu / FGV e Edições Próprias

·  Gerente de mais de 200 projetos em operadoras de planos de saúde, hospitais, clínicas, centros de diagnósticos, secretarias de saúde e empresas fornecedoras de produtos e serviços para a área da saúde e outros segmentos de mercado